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1.1Heraclito
1
Este estudo recolhe mais de três décadas de estudo do ensino da Filosofia, na Escola Média e na
Universidade, acumulando experiências de lecionação em Portugal e outros países. Recentemente o autor
encontrou eco e expressão das suas reflexões na obra de Mario Ariel Porta, A Filosofia a partir dos seus
problemas, Loyola, S. Paulo 2002.
*
Departamento de Filosofia, Universidade Federal da Paraíba. Telefone: 083.32511403
2
Excepto onde indicado, as traduções são da responsabilidade do autor. O fragmento joga com a
sinonímia de xynon e koinon e a decomposição de xynon em xyn e noon (vide frgm. 114). Daí a tradução
“consenso”, em vez do habitual “comum”. Embora essa tradução seja correta, encobre o jogo entre o
sentido do termo composto e os dos elementos que o compõem (vide W. Guthrie A History of Greek
Philosophy I, Cambridge 1971, 425, n. 5). Para a uma leitura ainda hoje inovadora de Heraclito, vide o
clássico de H. Fränkel, “A Thought Pattern in Heraclitus”, American Journal of Philology 59, 1938, 309-
337.
mensagem (logos) que o pensador dirige aos homens e que estes
não entendem quer a tenham ou não ouvido (frgm. 1).
1.2Parmênides
2. Platão: as Formas
3
Para uma introdução ao estudo dos fragmentos do Eleata, José Trindade Santos, Da Natureza,
Parmênides, Loyola, S. Paulo, 2002.
4
Para o exame do aproveitamento metodológico da geometria, no Ménon, vide “La struttura dialogica del
Menone: una lettura retroattiva”, in La struttura del dialogo platonico (a cura di Giovanni Casertano),
Napoli, 2000, 35-50; Id., “A anamnese no argumento do Ménon” in José Trindade Santos (ed.),
Anamnese e Saber, Lisboa, Imprensa Nacional, 1999, 63-92.
Na avaliação dos méritos do método dos geómetras, no final da
República VI (510b-c), Sócrates refere-se implicitamente ao
interrogatório acima descrito. Mas aproveita para observar que o
engano dos geómetras reside em não compreenderem que a
metodologia que adoptam lhes proíbe satisfazerem-se com o
sensível.
O valor reflexivo da metodologia platónica reside no modo como leva
o respondente a confrontar-se com sucessivos objetos
epistemológicos, cuja compreensão não lhe é proporcionada nem pelo
interrogatório, nem por um ensino anterior (Quadrado, área, maior,
menor, igual). Desse facto o filósofo infere que só lhe pode ter sido
fornecido anteriormente a esta vida; seja como for, que os possui a
priori.
3. Aristóteles: o universal
5
Na simples proposição “a chama queima” acha-se contido um número indefinido de experiências
passadas e ao mesmo tempo uma regra diretiva da ação futura.
mas não existe nele”,enquanto, nos dois passos acima referidos, é
abordado pela perspectiva da sua génese.
Formado “por abstração” a partir de uma pluralidade de imagens, é
dotado de uma existência problemática, já que, como predicado
atribuído a um sujeito, não pode existir nele. Pode, no entanto, ser
ele próprio convertido em sujeito de predicação, ao ser constituído
como objecto cognitivo (Seg. an. I18, 81b2-9).
3.1 Refletir
É isso mesmo que a análise da Metafísica I1 implica. Partindo do
limiar horizontal da sensação, a que todos os animais têm acesso, a
unidade e finalidade de toda a cognição é elaborada, na vertical, na
sucessão dos diversos patamares cognitivos, a cada um dos quais
corresponde uma operação mental.
A hierarquização do conhecimento a que se chega exemplifica e
evidencia o poder da reflexão, ao questionar cada operação cognitiva
acerca da finalidade que visa. Começa por as nomear (sensação,
memória, experiência, conhecimento da causa e dos seus modos),
mostrando a seguir o que cada uma delas é e o que produz, ou
constitui, na unidade da cognição. Inicia-se aqui a “problematização”,
pela qual cada operação é definida e integrada no todo. Mas o que é
“problematizar”?
4. Problematizar
8
A tripartição da alma é proposta a partir 436a. O exemplo de Leôncio (439e-440a) comprova-a,
ilustrando a “guerra da cólera com o desejo”. A tripartição da cidade é avançada em IV 420d sqq (vide III
415a sqq), com base na realização da tarefa que a cada parte é atribuída.
9
Na Rep. I 352d-353e, a aretê é definida, a partir do exemplo da “função” do cavalo, como “aquilo que
alguém pode realizar melhor, com ele”.
10
Nos diálogos socráticos, era manifesto que todas as virtudes constituíam uma espécie de saber. Por
outro lado, o Laques e o Protágoras tinham revelado que o problema da coragem residia na sua relação
única com o saber.
11
A negação do princípio da paridade das virtudes constitui uma inovação (vide a objeção às respostas de
Ménon, segundo as quais a ação virtuosa implica a justiça: 73a, d, 78d-79c).
constituído como objecto cognitivo, mediante nomeação e
subsequente definição.
Trata-se de uma operação decisiva, pela qual é criada a entidade que
deverá ser objeto de pesquisa, pois a nenhuma das entidades
nomeadas tem existência empírica12. Subsequentemente, a resolução
dos problemas que colocam ao investigador é conseguida mediante a
sua relacionação, em proposições, necessariamente consistentes com
as inicialmente fixadas.
Mesmo assim, não será demais repeti-lo, a verdade atribuída a cada
destas, bem como ao bloco que constituem, é condicional, pois não
passam de hipóteses, cuja solidariedade é testada pela metodologia.
Tecnicamente, cada uma delas não é mais que uma opinião,
verdadeira enquanto a sua aplicação à descrição do real o permitir13.
O caminho a percorrer para que o saber possa ser atingido é ainda
longo.
12
O raciocínio de Platão mostra bem que, para ele, uma cidade é muito mais do que a realidade física que
a suporta. Aristóteles, como vimos, resolveu o problema ao negar existência aos universais, em
Categorias 2, mas a sua crítica à cidade justa, assente no pragmatismo político, é demolidora: Política
II1, 1261a5-3 1266b8.
A lição a retirar da polémica é a de que aquilo que constitui problema para um dos pensadores não
constitui para o outro.
13
Veja-se, no Ménon a desqualificação da hipótese segundo a qual “a virtude é saber” não só pelo facto
de se não encontrarem na cidade mestres e aprendizes de virtude (89a-e), como pela necessidade
estratégica de conceder que Ménon e Ânito nalguma coisa se distinguem dos seus concidadãos (93a-95b,
96d-97c).
A solução é proporcionada pelo método “diaporético”, que associa
esses conceitos às diversas “dificuldades” (aporias), sobre os quais a
tradição reflexiva grega se debruçou14. Um excelente exemplo do
funcionamento da metodologia é o do tratamento aristotélico da
noção de “causa”.
O estudo da tradição cosmológica mostra que a generalidade dos
pensadores se entregou à procura de uma causa para o cosmos.
“Explorando bem” as dificuldades com que se confrontaram, o
Estagirita chega à sua formulação da teoria, segundo a qual a causa
se diz de quatro modos. Que lhe diz o estudo da tradição?
Os Milésios começaram por identificar a causa formal com a material.
Anaxímenes e os outros pensadores separaram-nas, mas só Platão, e
em parte os Pitagóricos, compreenderam a importância da causa final
e do “princípio do movimento e do repouso”. Finalmente, o próprio
Aristóteles será o responsável pela forma definitiva da teoria.
A enorme inovação da prática da problematização por Aristóteles
reside na possibilidade de constituir sempre novos objetos cognitivos,
operando dialeticamente pela divisão do género em espécies,
separadas pelas suas diferenças. Mas o filósofo distingue-se ainda
dos que o precederam por ter percebido que o Ser, colocado no topo
da pirâmide conceptual, não pode ser encarado como um género, sob
pena de funcionar a um tempo como sujeito e predicado.
II
1. Refletir e problematizar na sala de aula
3. 1 Alfabetização e letramento