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Todo cidadão tem o direito de protestar contra o uso de crianças em peças publicitárias que
considerem abusivas. Basta acionar o CONAR (Conselho Nacional de Auto-
Regulamentação Publicitária) para insistir que a veiculação do anúncio seja suspensa.
Como lidar com um mundo onde somos condicionados a viver para consumir?
Procurando manter os pés no chão. É bom que não se perca de vista que, em princípio, não
há nada de errado em consumir. Muito ao contrário. Além de prazeroso, o consumo é
necessário, já que traz vigor a economia criando empregos e gerando renda. De fato, o
consumo começa a se delinear como problema, a partir do momento em se constitui centro
das atenções, valores e energia de nossas vidas.
A construção da nossa identidade não deveria estar embasada nos bens materiais,
porém percebemos que este equívoco vem se tornando cada vez mais comum. É
somente uma questão educacional ou faz parte da sociedade do consumismo?
Do meu ponto de vista, as causas se misturam. De um lado, se há um evidente apelo à
construção da identidade social a partir do consumo - sou o que consumo -, de outro é
preciso admitir que no Brasil temos sido, para dizer pouco, displicentes ao não preparar
adequadamente nossas crianças para lidar com situações desse tipo. Como resultado,
criamos um ciclo em que a educação, além de não se interpor às provocações da sociedade
consumista, muitas vezes acaba por reproduzi-las, inclusive no ambiente escolar.
Como a relação entre pais e filhos pode ficar prejudicada quando o consumismo passa
a ser uma medida de amor?
De maneiras muito dolorosas. De um lado, filhos acostumados a ter tudo quanto peçam e
até ao que nem precisaram pedir, já na adolescência tendem a padrões de comportamento
que incluem apatia; impulsos auto-destrutivos (notadamente o uso de drogas); baixa
resistência a frustrações de todo tipo, além de acentuada imaturidade afetiva. Além disso, a
relação com os pais assume termos de chantagem, num jogo perverso em que nunca se
sabe ao certo "quem está chantageando quem".
Há um grande apelo na utilização de crianças em anúncios publicitários que cresce e
se torna mais sutil a cada dia. Como você vê esta questão?
É sem dúvida um assunto muito controverso. Alguns países europeus, por exemplo,
simplesmente proibiram a participação de crianças menores de 12 anos em anúncios
publicitários. Existe, inclusive, forte pressão para que essa medida seja estendida a toda
Europa. A simples divulgação dessa notícia no Brasil criou tamanho burburinho, que as
agências de publicidade correram a defender com estardalhaço seus interesses, de modo a
afastar a idéia de uma proibição desse tipo por aqui. Ainda assim, todo cidadão tem o
direito de protestar contra o uso de crianças em peças publicitárias que considerem
abusivas. Basta acionar o CONAR (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação
Publicitária) para insistir que a veiculação do anúncio seja suspensa.
Quem aprende melhor a lidar com o dinheiro: a criança se educada na mais tenra
idade ou o adulto que perdeu uma condição financeira estável e tranqüila, algo muito
comum no momento atual?
Por várias razões, a criança. Em primeiro lugar, se os pais adotam o sistema de mesada,
estão dando chance aos filhos de, ocasionalmente, falirem. E se há uma fase boa na vida
para ir a falência é na infância. Sem risco de ser processado, ver terminado o casamento,
perder a casa ou passar pelo constrangimento de ter o nome incluído nas listas da Serasa ou
SPC, falir com tão pouco dinheiro ensina a evitar as grandes falências na vida adulta, que
envolveriam muito mais dinheiro e sofrimento. Além disso, o modo como cada um de nós
lida com dinheiro costuma ser fixado até por volta dos 5, 6 anos de idade. A partir daí, a
tendência a repetir os mesmos padrões de comportamento, sem conseguir estabelecer
modificações realmente consideráveis, vai se consolidando no decorrer da vida. É
exatamente por isso que, não raro, encontramos pessoas que alternam, repetidamente,
períodos de abundância e falência, sem que pareçam capazes de aprender qualquer coisa
com uma ou outra fase.
Cássia D'Aquino Filocre - Educadora com especialização infantil, é autora de livros sobre
Educação Financeira.Criadora e coordenadora do Programa de Educação Financeira em
inúmeras escolas do País,Cássia é o único membro sul-americano da Internacional
Association for Children's Social and Economics Education (IACSEE), organização com
sede na Inglaterra. Colunista em diversas publicações, atua como palestrante em
Congressos de Educação e Encontros de pais no Brasil e exterior.
http://www.educacaofinanceira.com.br