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O IMPACTO DAS INCERTEZAS CIENTÍFICAS EM GESTÃO PÚBLICA NO

CENÁRIO DA PANDEMIA “COVID-19”.

RESUMO

Este artigo tem como objetivo analisar o conceito de Ciência desenvolvido ao longo da história humana,
principalmente observando a necessidade de consideração da imprevisibilidade e da incerteza como
elementos necessários das soluções científicas. Durante o combate contra o vírus COVID-19, muitos
atos de imposição de „verdades‟ ocorreram, criados pelas chamadas autoridades políticas e científicas,
com a escusa de que a obrigação de vacinas e a imposição de uso de máscaras, mesmo em ambientes
abertos, dentre outras medidas draconianas, seriam justificáveis por um patamar alto de “evidências”,
mas essas mesmas autoridades simultaneamente bloquearam experiências de tratamento com o uso de
drogas “fora da bula”, extremamente efetivas contra a doença, principalmente quando ministradas no
início dos sintomas. Essas práticas atentam contra a medicina baseada em evidências, contra os direitos
humanos e contra as liberdades fundamentais.

Palavras-chave: Ciência. Evidências Científicas. Probabilismo. Medicina Baseada em Evidências.


Liberdades Fundamentais.

ABSTRACT

This article is about the concept of Science, developed during the history of the mankind, principally
observing the necessity of understanding the unpredictability and the incertitude, as necessary elements
of the scientific solutions. During the war against COVID-19, happened many acts of imposition of
„trues‟ that were created by the called scientific and political authorities, under the excuse that the
obligation of vaccines and the imposition of use of masks, even in open places, and other draconian
measures, would be justified by a high level of evidences, but these same “authorities” simultaneously
blocked experiences of treatment with drugs “off label”, highly effectives against the disease, mainly
when given in the beginning of the symptoms. These practices are against the medicine based on
evidences, human rights and fundamental freedoms.

Keywords: Science. Scientific Evidences. Probabilism. Medicine Based on Evidences. Fundamental


Freedoms.

Apresentação.

O artigo retrata o vivido pelo Brasil e pelo Mundo, em face das incertezas geradas
pelo “novo Coronavírus”, diante de imposição político-jurídica de medidas de proteção e de
impedimentos de utilização e aquisição pública de fármacos para “tratamento inicial”, sob a
alegação da “ausência de evidências científicas”.

Na primeira parte, o artigo exporá o conceito de ciência tomado como válido na


modernidade, explorando a construção da miragem da “absoluta imutabilidade” do dito pelas
“autoridades científicas”, peando a evolução da ciência, subministrando medidas abusivas.

Na segunda, comentar-se-ão estudos pondo em xeque a absoluta eficácia de diversas


“práticas de contensão” difundidas pelo Brasil, expondo dúvidas a efeitos de fármacos, como
vacinas em estágio experimental, refutando comprovações científicas da eficácia do uso de
medicação “off label”, no espeque da “medicina baseada em evidências”.

Na terceira, apresentar-se-ão decisões judiciais do STF, do STJ e do TCE-PR que, ao


arrepio do princípio da cautela – regra para a proba gestão pública – inviabilizam a utilização
de tratamentos por fármacos, com uso “off label” por gestores, sob a justificativa da “falta de
comprovação científica”. Confunde-se impedimento legal de aquisição de medicamentos
“sem registro na ANVISA” com o de medicamentos registrados, e redirecionados.

1. Reflexão sobre o conceito de Ciência.

O conceito de ciência, difundido na contemporaneidade, sustenta-se no método


cartesiano, na coleta empirista de dados que brilhantemente fora criticado por Louis Lavelle
com o termo “empirismo lógico” das ciências modernas.1 Por método cartesiano, entende-se o
sistema de subsunção de determinado fato à correspondência numérica de sistema analítico
firmado por métodos inflexíveis, abstratos e pré-reconhecidos que fixa absoluta separação
entre sujeito que conhece e objeto conhecido, cabendo ao primeiro estabelecer as normas
científicas, conforme “combinação de partículas” que definem a heterogeneidade, reduzindo o
mundo ao aspecto mecânico.

A coleta de dados empirista, variante superficial do método indutivo, é especificação da


amplitude de atuação do homem, buscando dados da natureza pelas sensações, encaixando-os,
em conformidade com normas “científicas” cartesianamente fixadas. Destaca que apenas
dados convenientes com a regra “científica” são considerados significativos para “pesquisas”,
tendo em conta a percepção de repetição por acessíveis instrumentos de coleta.2

Nada obstante os benefícios tecnológicos de tal método, um estudo mais aprofundado


revela-nos que se deu espúria apropriação pela multidão de conceitos científicos profundos. E
assim diversos conceitos científicos passaram a ser tomados como espécies anômalas de
“dogmas”, pelo dito das “reconhecidas” autoridades científicas, difundidos por populares

1
“Assim se constitui a doutrina que podemos chamar de empirismo lógico e que, tomando da
experiência dados e não uma simples via de acesso ao real, e da lógica uma linguagem e não uma lei de
inteligibilidade, preocupa-se apenas em estabelecer uma correspondência entre esses dados e essa linguagem
evitando o problema, que lhe parece mal colocado, o da concordância entre o pensamento e a realidade,
resistindo aos ídolos do racionalismo e se apresentando com um desenho tão nítido, uma simplicidade tão
elementar e tão segura, que se entende facilmente o sucesso que obteve nos países da Europa central e na jovem
América”. LAVELLE, Louis. Ciência Estética e Metafísica, p. 201.
2
“O que caracteriza a doutrina [do empirismo lógico], portanto, é supor, por um lado, que o real é o
dado em si, sem que tenhamos de nos perguntar nem como ele pode ser afirmado nem qual é a sua relação com o
espírito que o afirma (pois esse seria o tipo mesmo de pseudoproblema), por outro lado, é sustentar que esse real
pode ser descrito por um conjunto de símbolos que devem estar em correspondência com o dado que
simbolizam. De direito, o mundo simbólico ultrapassa o mundo real”. Idem, p. 202.
meios de comunicação. Passando a adquirir teor de validade “absoluta” na descrição da
realidade, na “previsão de possibilidades futuras”.

Destaca-se a crença indelével na validade impreterível das chamadas “evidências


científicas” que, justamente pela politização, pela passionalidade vivida pela coletividade, em
tempos de Pandemia, assumiram status de porto de segurança de expectativas futuras. O
termo – “evidências” – foi deturpado pela “crença” cega em “dados” divulgados por
“autoridade” considerada “confiável” pelos “fazedores de opinião”. A “ciência válida” e
“cartesianamente reconhecida” implica na ocorrência da satanização de “dúvida” posta contra
seu imperativo metodológico, ainda que sustentada por verificação fática (e casuística) ou por
análises que não alcançaram o “patamar” de “verdade indelével”.

Vive-se situação de integral ocorrência de aceite incondicional do “afirmado” como


“resultado suficiente” de levantamento hipotético de dados, por eventos, segundo regra de
verificação por repetição fixada. O conceito de ciência, considerado de maneira escorreita,
traz a lume seu aspecto originante que, uma vez desconsiderado, reduz-se a verniz arbitrário.
Está-se a falar da “incerteza”, do “probabilismo” ou da “corrigibilidade” que permeia a noção
típica de ciência, direcionando-a para possibilidades futuras, pela rigorosa observação do
passado.

O conceito de ciência foi cunhado ao longo do tempo por inúmeros pensadores, mas,
seguindo parametrização “geral”, pode-se ser subdividido em três grandes sentidos3.

O primeiro sentido é o de sistema de percepção rigorosa dos elementos imutáveis ou


“perenes” do “mundo da vida”, em forte oposição a todas as coisas conduzidas pela
mutabilidade. Platão, no Ménon, propunha oposição indelével entre a ciência – que trata das
coisas imutáveis – e opinião – temente à mutabilidade – comparando a última às “estátuas de
Dédalo”, apresentadas pelo escultor, sempre em atitude de fuga.

O conceito enriqueceu com Aristóteles e com os esforços de pensadores medievais, na


estirpe de Santo Tomás de Aquino. A “imutabilidade” da ciência – enquanto atada a
conceitos rigorosos – encontra-se explicada por dois componentes: a “demonstração” e a
“abstração”. Na demonstração, afixa-se que o saber científico depende do conhecimento da
sua “causa”, da fonte ontológica sem a qual o objeto não existiria. A causa é quadripartida
pelo Estagirita: causa material, causa formal, causa eficiente e causa final. Como material,
entende o “elemento potencial pleno” no qual será inserta a forma; formal, a estrutura

3
Cf. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia, p. 136.
potencial de como poderá vir a ser a coisa; eficiente, a “força” de orientação, o “vigor” de
inserção da forma; final, o objetivo fixado pela “intenção” do agente.

Pela labuta de Santo Tomás de Aquino, o conhecimento “científico”, relacionado à


sapiência das referidas causas, elege a causa final como de preferência ontológica. O Angélico
foi preclaro ao sustentar que, nada obstante as quatro causas aristotélicas serem leitmotiv da
compreensão de ciência, haveria de o sábio preocupar-se, acima de tudo, com a causa final. A
“finalidade” do fenômeno conduz à compreensão da (in)validade da ciência. Potencialidade
(matéria), vigor de produção (eficiência) e o modelo proposto (forma) coordenam-se pelo
determinado na finalidade. É na “conclusão” que se pode conceber o saber científico.4

A ciência trata da compreensão dos princípios regentes da realidade, “princípios de


demonstração” percebidos na “concordância”, na “condução” simultânea, atrelados a
conclusões. A ciência é demonstrações direcionadas para finalidade concreta. A compreensão
separada de princípios de demonstração, destarte pertencer à atividade do intelecto, não o é da
ciência.5 Esse respeito indelével da ciência ao conhecimento relacionado ao atrelar de
princípios de demonstração da causa final (conclusão), declarando-a “prioritária”, é matizado
pela “abstração”, o segundo componente explicativo do primeiro sentido de ciência.

A demonstração firma-se na apresentação da condução, do “vir a ser” da ciência, de sua


movimentação; a abstração, por seu turno, expõe o “objeto” dela, corresponde ao componente
“do que é por si tratado”. Abstrair significa “separar” no pensar o que, na realidade, não pode
sê-lo, “insula” no pensamento o que não pode na simples representação.6

Ontologicamente, abstrair é “separar mentalmente” o que não está separado, criando


conceitos “gerais” aplicáveis na realidade, ainda que para objetos ainda não existentes. Pela

4 “Demais. - Na distinção das potências, dos hábitos e dos atos, quanto aos seus objetos, considera-se
principalmente a razão formal destes, como do sobredito se colhe. Logo, diversos hábitos não se diversificam
pelo objeto material, mas pela razão formal deste. Ora, o princípio da demonstração é a razão de se conhecerem
as conclusões. Logo, o intelecto dos princípios não deve ser considerado como um hábito ou virtude diferentes
da ciência das conclusões.” SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica, Ia IIae parte, Q. 57, Art. 2.
5
“RESPOSTA À SEGUNDA. - Quando o objeto, por natureza se refere por um só ato, a uma potência
ou a um hábito, não se distinguem então os hábitos ou as potências pela razão do objeto e pelo objeto material;
assim, à mesma potência visiva pertence ver a cor e a luz, que é a razão de vermos a cor, e é vista
simultaneamente com esta. Ora, os princípios da demonstração podem ser considerados separadamente, sem
considerarmos as conclusões. Também podem considerar-se simultaneamente com estas, enquanto são
conducentes a elas. Ora, considerar os princípios, deste segundo modo, é próprio da ciência, que considera
também as conclusões. Considerar porém os princípios, em si mesmos, é próprio do intelecto. Por onde, quem
refletir retamente verá que essas três virtudes não se distinguem, por igual, entre si, mas numa certa ordem. Pois,
assim como num todo potencial, uma parte é mais perfeita que outra, como, p. ex., a alma racional o é mais que a
sensível e esta, que a vegetativa; assim também a ciência depende do intelecto como do principal; e ambos, da
sapiência, como do principalissímo, e compreende em si o intelecto e a ciência, pois julga das conclusões das
ciências e dos princípios das mesmas.” (destaques nossos), Idem.
6
SANTOS, Mário Ferreira dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais, p. 13.
abstração criam-se “regras gerais” obtidas da observação das coisas, firmando-se “norma” de
existência “esperada”, “provável” quanto ao que virá-a-ser. Importante notar que a abstração
“propõe” a exclusão das qualidades de diversos objetos, alcançando o que “os torna
observados”, o que lhes é próprio, imutável (sua substância). Abstração não pode ser
confundida com “análise científica”.

Na análise científica, considera-se cada objeto – rigorosamente dividindo-o por suas


qualidades, “(des)formatando” sua singularidade concreta, considerando o verificado como
comum a um grupo, conforme “efeitos ordinários em fenômenos abstraídos”. Na abstração,
não obstante procedimento assemelhado ao da análise, sua finalidade é a de encontro de regra
“abstrata” e geral, válida por si, aplicável em eventos outros.7

Pela abstração, as “regras gerais” da ciência são confeccionadas, considerando


potenciais e assemelhados eventos futuros, os quais, uma vez abstraídos, darão azo para o
aparecimento de normas de comportamento que se fixam no espírito, orientando
rigorosamente a atenção para demais ocorrências.8

Santo Tomás de Aquino foi responsável por traduzir ao Ocidente o conceito de


abstração, enquanto corolário do conhecimento científico, o saber das razões primeiras, das
qualidades permanentes e das finalidades últimas. A abstração – como ferramenta formadora
da ciência tem dupla atuação: “capta” qualidades de objetos puramente ideais, com
predominância intelectual; e os corpóreos, com predominância material, expondo o rigor
explicativo dos fenômenos, na conformidade com os “universais”. Dá-se, então, a “lei

7
“[A abstração] não deve ser confundida com a análise (vide). Esta considera igualmente todos os
elementos da representação analisada, e divide em partes uma coisa composta; considera, insulanamente, uma
qualidade comum a uma multidão de compostos. Assim reconhecer a brancura de uma rosa determinada é fazer
análise; conceber a brancura em si-mesma, como qualidade peculiar a um grande número de objetos, é proceder
abstração. A abstração é, portanto, a base da formação das ideias gerais. (…) Assim, toda idéia geral é abstrata,
porque não contém os característicos dos sujeitos, objetos que representa. Muitos consideram que uma idéia
abstrata pode não ser geral. É o caso de considerar, apenas, a cor branca deste papel. É somente o branco deste
papel que consideramos abstratamente, fazendo abstração das outras qualidades.” Idem, p. 13.
8
“Essa acentuação da atenção sobre uma qualidade não é ainda uma abstração ou ato abstrativo, embora
a gere, porque se fixa no espírito, pela atenção que mantemos sobre algum objeto ou parte deste, e o
comparamos com outro semelhante. Esse ato atencional é um estatizar do que se dá dinamicamente. Não
podemos abstrair algo sem algo que se compare com outro, que lhe é semelhante. Se verificamos que tal fato
antecede tal outro - por exemplo, que ao esquentar a água, até certo ponto, ela entra em ebulição – podemos
verificar tal fato com maior ou menor atenção, desatendendo outros que sucedem ao derredor. E se verificamos
esse fato numerosas vezes, concluímos que a água, quando esquentada até certo ponto, entra em ebulição.
Podemos concluir que a ebulição é causada pelo calor intenso. E se ao verificar outros fatos, vemos se são
causados por outros, e ao comparar a relação existente desses fatos uns com os outros, concluímos que existe um
princípio de causa e efeito, e atribuímo-lo a toda a natureza, realizamos uma abstração, porque a ideia de causa e
efeito é uma abstração feita de um semelhante, que se dá numa série de fatos semelhantes.” Ibidem, p. 15.
científica”, com presunção de validade geral.9

A ciência, por este primeiro sentido, aborda a criação de “leis gerais” para compreensão
de fenômenos potenciais futuros assemelhados a fatos originantes, sem se reduzir a regras
gerais desconectadas da realidade. Evita-se, com isso, a redução da ciência à “pura abstração”,
até porque não faria sentido a ciência não se comprometer com elemento concreto, com o
“fato da vida”. Defender ciência por demonstração e por abstração sem referência à realidade
concreta significa criar “teses gerais” cuja credibilidade firma-se, na “confiabilidade”, na
opinião de autoridade.

A “confiabilidade” de posição sobre determinado objeto sustenta-se em um ou em


alguns aspectos da ocorrência, e não em todos os nuances do objeto, virtualizando
possibilidades específicas, inviabilizando conclusão veraz do observado. Eis o vício do
“abstractismo” que substitui a “ciência” pelo “cientificismo”.10

O vício do cientificismo é o do afastamento dos princípios dedutivos de finalidade


concreta (causa final factível) e, simultaneamente, virtualização de aspectos vários do
fenômeno, com relevância de pontos atinentes à narrativa mais apropriada. Esses dois
componentes do primeiro sentido de ciência não foram abandonados pelo conceito moderno
de ciência.11

Afixou-se a tendência da falsa concepção de que a resposta de autoridade científica, em


conformidade com regras abstratas, significaria o esgotamento da compreensão do fato, a
desconsideração de outras posições, chamadas de “opiniões de senso comum”. E isso é ascese
ególatra e materialista de se considerar o “homem como o centro do universo”, o detentor da
bitola “divina” de construir realidades.

O segundo sentido de ciência foi cunhado pelo Iluminismo, sobretudo a partir do

9
Segundo Tomás de Aquino: “No conhecimento da verdade, nossa inteligência usa de uma dupla
abstração. Pela primeira, ela capta os números, as grandezas, as figuras matemáticas, sem pensar na matéria
sensível. Quando pensamos no número três, na linha ou na superfície, no triângulo ou no quadrado, nada
encontramos em nossa apreensão que se refira ao quente ou ao frio, ou a qualquer outra qualidade que possa ser
percebida pelos sentidos. A segunda abstração serve à nossa inteligência, quando ela conhece um termo
universal, sem ser representado qualquer termo particular, quando, por exemplo, pensamos em homem, sem
pensar em Sócrates ou em Platão, ou não importa em que outro indivíduo. Poder-se-ia mostrar a mesma coisa
através de outros exemplos” Ibidem, p. 16.
10
“c) Tendência a supervalorizar um aspecto da realidade, que é atualizado, enquanto se virtualizam
outros, que se dão na sua concreção, de modo a reduzir estes últimos ao primeiro. Neste sentido, preferimos o
termo abstratismo. São abstratistas o historicismo, o psicologismo, o ecologismo, o materialismo econômico
(economismo) e, em geral, todos os ismos.” Ibidem, p. 17.
11
“O surgimento da ciência moderna não pôs em crise esse ideal. De um lado, o necessitarismo dos
aristotélicos é compartilhado até por seus adversários; de outro, persiste a sugestão da matemática como ciência
perfeita pela sua organização demonstrativa.” ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia, p. 137.
pensamento de Descartes e de Bacon. Com posição de análise da realidade diametralmente
oposta ao do primeiro sentido, não mais presa por ciência da busca pelo permanente, pela
substância. Recrudescida pelo positivismo oitocentista, reduz-se à observação de fatos
particulares, distinguindo-os, por descrições, chegando a induções superáveis por novos
experimentos. Negou-se o estribo em princípios permanentes, assumidos como causas.
Firmou-se a “nova ciência”, na descrição repetida do que é “meramente descoberto”. Dá-se o
império do empirismo, a concepção da ciência, não como “compreensão de causas”, mas
como demonstração do caráter operacional da apresentação dos corpos.12

O sentido meramente “descritivo” é defendido pelos positivistas, primando pela


composição quantitativa verificada por instrumentos de análise científica. A sanha de
conceber a ciência como descrição rigorosa de fenômenos forçou que a humanidade
promovesse o patrocínio de técnicos especializados em cada área, dividindo o saber em
“partes”. Descreve melhor o fenômeno quem está mais atento a regras recorrentes em área
delineada para si na verificação de fatos assemelhados, em nicho ambiental. E esse segundo
sentido de ciência (enquanto disciplina de reconhecimento e de exposição) promoveu a
ascensão do “especialismo”, a banausia grega, alimentando o problema ventilado do
“abstractismo cientificista”.

O especialista, treinado por anos a fio para reconhecimento e exposição de fatos


recorrentes em ambiente fixo, firma sua atenção para aspectos da realidade, permanecendo
omisso em relação à complexidade holística do dado. A virtualização da complexidade do
objeto pelo especialista, bitolado no desvelamento do que lhe interessa, é negação ao
universalismo, condenação da humanidade ao aceite fechado de resposta “pontual” ao
cadastrado por especialidade.

O especialismo é variante do abstractismo. Instrumento de poder do Estado Imperioso,


dividindo as “autoridades”, conforme a voz garantida, negando opinião, se proferida por
estudiosos não oficialmente reconhecidos, ainda que com valência ética altissonante.13 E a

12
“A Ciência reduz-se, assim, à observação dos fatos e às inferências ou aos cálculos fundados nos fatos.
O positivismo oitocentista não fazia mais do que recorrer ao mesmo conceito de ciência. Dizia Comte: O caráter
fundamental da filosofia positiva é considerar todos os fenômenos como sujeitos a leis naturais invariáveis, cuja
descoberta precisa e cuja redução ao menor número possível constituem o objetivo de todos os nossos esforços,
ao mesmo tempo em que julgamos absolutamente inacessível e sem sentido a busca daquilo que se chama de
causas, tanto primeiras como finais”. Idem, p. 138.
13
“A valorização do especialismo surge da consciência, que se toma em primeiro lugar, do acervo
imenso de conhecimentos particulares e da impossibilidade que limita nossa vida e nosso conhecimento em
poder acompanhar tudo quanto é descoberto, achado, conquistado. Então, surge aos olhos de muitos, que é
preferível conhecer-se bem alguma coisa em particular do que mediocremente muitas em geral. O universalismo
ciência “experimental” dos especialistas, é só válida, se “autorizada” pelas “autoridades
políticas”, o que mostra a interferência do sistema político no científico.

O terceiro sentido de ciência apoiou-se na severa crítica ao autoritarismo do modelo


cientificista. No que toca à observação da matéria, as colocações científicas de Heisenberg, as
de Einstein e as da física quântica mostraram mudança da natureza dos corpúsculos
minimalistas – partículas subatômicas – ora comportando-se como ondas ora propriamente
como partículas. O fenômeno dualidade “onda-partícula” provou que, bastando observação
do evento pelo cientista, elementos mostravam-se ocupando posição no espaço,
presumidamente dotados de massa e de forma definida, mas comportando-se como
perturbações no espaço, com posições definidas e transporte de energia. Advertindo que a
conduta do objeto relaciona-se ontologicamente com a observação de seu aspecto, a medição
torna aparente o “verificado”, pondo pá de cal no modelo empirista e cartesiano de construção
da ciência pelo sujeito “ideologicamente neutro”, em face de “objeto substancialmente
passivo”.

A “mostração” do objeto se faz pela “presença” do sujeito, por sua “atenção”, fixando
artefatos da natureza, por perenidade de atualização de possibilidades formais, por
comportamentos não simplesmente previsíveis (ou absolutamente presumidos) em
mecanismos empíricos de análise quantitativa de dados. A ciência advém como dependente
do “risco”. A mudança comportamental dos fatos da natureza impede que se creia em
princípios científicos estanques, na posição de autoridade que, nada obstante defenderem
análise científica, ficam premidas pela virtualização de diversos aspectos do objeto,
privilegiando justo os que lhes convêm.

O efeito concreto desta inversão na percepção da realidade da ciência foi o de se


promover atitudes científicas, levando em conta critérios da fenomenologia cujo preceito
principal foi o da necessidade de superação do abismo abstractista entre sujeito e objeto.

do conhecimento é combatido em favor do especialismo, e o especialista começa a surgir aos olhos dos menos
percatados como representante de um nível mais alto de cultura. Contudo, na verdade, não foram as mentes da
banausia que criaram algo de novo e de grande para a humanidade, mas precisamente aqueles que invadem
vários setores do conhecimento. Por isso, não é de admirar que a Humanidade deva mais aos autodidatas o seu
progresso intelectual que aos prisioneiros de uma escolaridade particularista. Ademais, os poderosos sabem que
o melhor meio de dominar é dividindo. E como desejam dominar uma totalidade, como poderiam dividi-la em
partes? O processo é simples: dividam-se os homens pelo conhecimento, de modo que nada em comum haja
mais entre um médico e um engenheiro, que não podem mais manter entre si uma conversação sobre temas
superiores, porque estão ambos distantes um do outro, e separados por um abismo de ignorância, pois o médico
orgulha-se de ser nesciente da engenharia e o engenheiro exibe o galardão da sua ignorância total da medicina.
Desse modo, estarão separados pelo espírito. Mas poderão estar unidos pelo poder coativo do Estado ou do
partido, ao qual servem como "soldados fiéis" ou "correligionários". Desse modo, os poderosos, dividindo,
melhor podem governar.” SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia e História da Cultura, Vol. II, p. 39.
Precedentes científicos hão de se sujeitarem a fatos, a possibilidades de comportamento da
própria existência. Deve-se considerar a infinidade de valores, de expectativas, de
necessidades e de interpretações de vida e do mundo. A regra „constante‟ para a ciência é a da
sua mutabilidade, da incerteza e das expectativas.14

Retoma-se plena validade do primeiro sentido de ciência. A concatenação de princípios


demonstrativos direcionados por conclusão factível com leis gerais (abstratas) casuisticamente
aplicáveis no encontro da verdade, comportando-se em vista da importância dos valores, das
pessoas, de suas expectativas na construção de regras científicas verossímeis. Por óbvio, traz-
se a relevância da incerteza, do risco, do falibilismo da ciência “em certo momento”,
comprovando sua indelével autocorrigibilidade.

Os esforços do “cientista” é os de pôr em xeque “certezas garantidas” por preceitos


científicos válidos, clareando efeitos imprevisíveis, outrossim prejudiciais à expectativa das
pessoas, nas aberturas da técnica científica. Busca-se, com todas as armas possíveis, a
negação de antecipações de ordem, conforme o decido pela autoridade, impedindo que regras
científicas – sobretudo as de caráter experimental – adquiram força imperativa de trato
normativo, apenando os que as descumpram ou, mesmo, os que delas simplesmente
desconfiem.15

A grande superação da ciência interpretada pela fenomenologia, pela ascese da


faliabilidade, registra-se no “operacionalismo”, na consideração de que a validade de critério
científico de ordem de autoridade é seguramente válido, na medida do ambiente de sua
demarcação espacial e temporal.

Indo além da demarcação temporal e espacial, não há segurança quanto à pertinência e à


validade da regra científica fixada pela “autoridade” governamentalmente reconhecida. Justo
por isso, totalmente incabível que determinações científicas justificadas como

14
“É neste mundo (no mundo da vida) que nós nos encontramos, enquanto mundo de todas as realidades
conhecidas e desconhecidas. É neste mundo da intuição que efetivamente se faz experiência (comprova por
experiência) que pertence à forma espaço temporal, com todas as figuras corporais que se inscrevem nele, é nele
que nós mesmos vivemos, conforme nosso modo de ser, em toda carne de nossa pessoa.” HUSSERL, Edmund.
La crise des sciences européenes. P. 59, tradução livre.
15
“Em termos aparentemente paradoxais, mas equivalentes, K. Popper afirmara, em Lógica da descoberta
científica (1935), que o instrumental da C. não está voltado para a verificação, mas para a falsificação das
proposições científicas. 'Nosso método de pesquisa', dizia ele, 'não visa defender as nossas antecipações para
provar que temos razão, mas, ao contrário, visa destruí-las. Usando todas as armas do nosso arsenal lógico,
matemático e técnico, tentamos provar que nossas antecipações são falsas, para apresentar, no lugar delas, novas
antecipações não justificadas e injustificáveis, novos 'preconceitos apressados e prematuros' como escarnecia
Bacon' (The Logic of Scientific Discovery, ed., 1958, § 85, p. 279). Com isso, Popper pretendeu assinalar o
abandono do ideal clássico da C: O velho ideal científico da episteme, do conhecimento absolutamente certo e
dernonstrável, revelou-se um mito.” ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia, p. 139.
“provavelmente” efetivas, sem análise fenomenológica de seus efeitos “em face” do mundo
da vida, das expectativas das pessoas e da consciência e reconhecimento de riscos,
correspondam automaticamente a fundamento justificador de coações legais ou judiciais. É
por tal raciocínio que se põe em xeque o conceito de “evidências científicas”.

Considerando suficiente e unicamente o segundo sentido de ciência, eivado pelo vício


do cientificismo, reduzido pelo quantitativismo, pelo especialismo, as evidências científicas
corresponderiam à simbiose entre o argumento de autoridade somado à confecção de regra
científica baseada em repetições captadas pelos sentidos dos “cientistas” oficialmente
reconhecidos. É claro que as conclusões da ciência ficam limitadas à demarcação temporal e
ambiental, pré-determinadas por interesses outros, nem sempre aderidas à busca pelo
verossímil.

Limitadas por tal emblema, as evidências científicas passam a servir de justificativas


políticas para imposição de regras, tendo em conta suposta “absoluta veridicidade”, atentando
claramente à liberdade do homem e à sua faculdade de pôr em dúvidas informações
“completas que a si” são apresentadas, negando-se a desconfiança.

É preciso que outros sentidos de ciência, firmados pela teoria fenomenológica, tendo em
conta o probabilismo, o risco e a autocorrigibilidade sejam trazidos à baila, no instante da
consideração das “evidências científicas”, enquanto fundamento para medidas legais e
jurídicas de imposição de deveres ou assecuritárias de garantias.

2. Medicina baseada em “evidências” e as incertezas da pandemia Covid-19.

“Evidências científicas” são os pontos de apoio para a justificativa de criação de


protocolos sanitários – tratando-se de políticas públicas em tempos de Pandemia – bem como
para autorização do uso fidedigno de medicamentos para combate ou prevenção de doenças.
Tendo em conta a interferência dos diversos sentidos de “ciência” conforme exposto, a
presença de valores “políticos” e “jurídicos”, temperados pela desinformação dos meios de
comunicação em massa, vem dificultando o entendimento escorreito do termo para
julgamento justo de práticas médicas.

Em medicina, o termo traz consigo o conceito mui popular de a “medicina baseada em


evidências”, cuja explicação não é nova. David L. Sackett, em 1996, em seu artigo “Evidence
based medicine: what it is and what it isn't” já estabelecia os parâmetros mínimos para o
entendimento da terminologia. A medicina baseada em evidências parte, prioritariamente, de
explícita, judiciosa e consciente observação de situações individuais, buscando solução para
“este” caso, com integração da casuística com as melhores avaliações clínicas trazidas por
pesquisas externas.

A expertise individual nada mais seria do que o julgamento do médico, construído por
experiência casuística, ao longo dos anos, tendo em conta observações sobre diagnósticos,
identificação de variantes, preferências e direitos que deram azo para suas decisões clínicas.

A melhor avaliação clínica externa envolve o resultado da observação de pesquisas de


ciências médicas básicas, com direcionamento preciso, incluindo exames clínicos, a partir de
indicativos gerais de prognósticos, protocolos e, até mesmo, regimes preventivos, sendo
comum a regra das contínuas mudanças de tratamentos, troca dos já ultrapassados, tudo em
pró do mais seguro.16

Interessante anotar que o conceito de medicina baseada em evidências afasta-se de


apreciação “geral”, de regra abstrata aplicável a “todos”, independente “do” caso particular;
aproximando-se, por óbvio, o particular analisado por médico dos conteúdos gerais dados por
protocolos. E isso porque, caso o médico siga regramentos de protocolos, pondo de lado
experiência clínica, dar-se-á espécie de “tirania das evidências”, o que torna o método
inaplicável e inapropriado para “certo” paciente17, afastando o objetivo mor da própria ciência
que é integrar o comportamento clínico optado pelo médico com os valores do paciente18.

As evidências clínicas externas, construtoras de protocolos gerais, são insubstituíveis


instrumentos de apresentação de possibilidades de tratamento, e a experiência individual
clínica é que “decidirá” se a hipótese será efetiva para o paciente individual atendido,

16
“Evidence based medicine is the conscientious, explicit, and judicious use of current best evidence in
making decisions about the care of individual patients. The practice of evidence based medicine means
integrating individual clinical expertise with the best available external clinical evidence from systematic
research. By individual clinical expertise we mean the proficiency and judgment that individual clinicians
acquire through clinical experience and clinical practice. Increased expertise is reflected in many ways, but
especially in more effective and efficient diagnosis and in the more thoughtful identification and compassionate
use of individual patients' predicaments, rights, and preferences in making clinical decisions about their care. By
best available external clinical evidence we mean clinically relevant research, often from the basic sciences of
medicine, but especially from patient centred clinical research into the accuracy and precision of diagnostic tests
(including the clinical examination), the power of prognostic markers, and the efficacy and safety of therapeutic,
rehabilitative, and preventive regimens. External clinical evidence both invalidates previously accepted
diagnostic tests and treatments and replaces them with new ones that are more powerful, more accurate, more
efficacious, and safer.” SACKETT, David L. Evidence based medicine: what it is and what it isn't, BMJ, Vol.
312, P. 71.
17
“Good doctors use both individual clinical expertise and the best available external evidence, and
neither alone is enough. Without clinical expertise, practice risks becoming tyrannized by evidence, for even
excellent external evidence may be inapplicable to or inappropriate for an individual patient.” Idem.
18
“The argument that 'everyone already is doing it' falls before evidence of striking variations in both the
integration of patient values into our clinical behaviour7 and in the rates with which clinicians provide
interventions to their patients.” Ibidem.
conforme as circunstâncias vividas.19

A medicina baseada em evidências não é própria e definitivamente dependente de


“estudo randomizado”, “duplo cego” ou “meta-análise” (ainda que tais instrumentos não
sejam contraditórios consigo),20 pois ela reflete o sentido último da ciência que é a de ser
executada por homem consciente da realidade em que vive, das forças narrativas que
comprimem a sua atuação, matizado pela liberdade de buscar informações que melhor se
coadunem com sua experiência de vida em auxílio do paciente.

Justificativa óbvia do dito é que a “medicina real”, em situações anômalas – como


epidemias, pandemias, estados de guerra – exige intervenções pautadas em estudos
disponíveis, reforçados por experiência clínica, sendo obviamente impossível aguardo de
resultados de “testes randomizados”.

A medicina pautada em evidências prioriza a autonomia médica de promover opções de


tratamentos, de prescrições de fármacos, pautada na honestidade decisória, alinhada à melhor
evidência presente, no momento do atendimento, não fazendo sentido deixar de tomar
decisões, por conta de “imposição protocolar” que suprima a expertise do médico ou a
condição individual do paciente. As evidências científicas, aplicadas em medicina, indicam
níveis de efetividade continuamente agrupados, em conformidade com a convivência
indelével da clínica com riscos e incertezas de determinado fármaco ou tratamento.

A partir da proposta do Professor Sackett, algumas tabelas indicativas dos níveis de


evidência aplicáveis nas ciências médicas foram sugeridas por diversos estudos.

Em pedagógico artigo publicado em site técnico do US National Library of Medicine –


National Institutes of Health21, intitulado “The Levels of Evidence and their role in Evidence-
Based Medicine”, Patricia B. Burns, Rod J. Rohrich, e Kevin C. Chung despontam o grande
lapso entre a “solução única”, por fórmula certa, e a “solução diagnóstica de casos”, a partir
de possíveis tratamentos. O estudo confirma que evidências científicas em medicina possuem
patamares de efetividade e, portanto, dá-se a convivência do médico com o tratamento
disponível, a consciência quanto a riscos, a ineficácia presumida ou, mesmo, a efeitos

19
“External clinical evidence can inform, but can never replace, individual clinical expertise, and it is this
expertise that decides whether the external evidence applies to the individual patient at all and, if so, how it
should be integrated into a clinical decision.” Ibidem.
20
“Evidence based medicine is not restricted to randomized trials and meta-analyses. It involves tracking
down the best external evidence with which to answer our clinical questions. To find out about the accuracy of a
diagnostic test, we need to find proper cross sectional studies of patients clinically”. Ibidem.
21
Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3124652/. Acessado em 04/07/2021.
inesperados ou adversos.

Expõe-se o modelo canadense de análise das evidências, para fins de direcionamento do


pesquisador-médico, fixando-se quatro níveis hierarquicamente dispostos de evidências: o
primeiro, quando há ao menos um teste randomizado específico; segundo, se há estudo sobre
determinado “coorte” ou caso controlado; terceiro, comparações em séries (por literatura
médica e relato de casos) e resultados observados de estudos sem controle; quarto, a opinião
de especialistas.22

Em paralelo, traz a proposta de Sackett, adaptada de seu artigo “Rules of evidence and
clinical recommendations on the use of antithrombotic agentes”. Por tal alvitre, o primeiro
nível de evidência abrangeria informações obtidas de amplos estudos randomizados, com
resultados claros; o segundo, de estudos menos amplos com resultados não claros; o terceiro,
de estudos sobre “coortes em experiências, separando casos controlados”; o quarto, de análise
histórica sobre estudos controlados de casos; o quinto, de constatação de série de casos
(clínicos) e de estudos sem controle.23

E uma terceira tabela explicativa é introduzida, oriunda do Centro de Medicina Baseada


em Evidências, constando os seguintes níveis de evidência: 1A – revisão sistemática com
homogeneidade de estudos randomizados; 1B – estudo randomizado individual com pequenos
intervalos; 1C – todos (ou nenhum) estudo confirmando (ou não) o caso; 2A – revisão
sistemática de estudos em coortes específicos de casos; 2B – estudos individual sobre um
cotejo determinado, incluindo estudos de baixa qualidade (80%); 2C – pesquisas livres com
resultados e estudos “ecológicos” (ambientais); 3A – revisão sistemática de estudos
controlados de casos; 3B – estudo controlado de caso individual; 4 – análise de casos em
série; 5 – opinião de estudiosos com conhecimento crítico baseado em fisiologia, pesquisa ou
“princípios básicos”.24

Nada obstante a indicação de outras tabelas, o texto clareia ser preciso convivência da
prática médica e da análise científica de casos para aplicação de opções de tratamento, de
criação de políticas públicas e de imposições judiciais, tendo em conta o “grau de incerteza”
que sempre existe em qualquer espécie de opção científica.

22
BURNS Patricia B. ROHRICH Rod J. CHUNG Kevin C. The Levels of Evidence and their role in
Evidence-Based Medicine. US National Library of Medicine – National Institutes of Health.
23
SACKETT DL. Rules of evidence and clinical recommendations on the use of antithrombotic agents.
Chest 1989; 95:2S–4S.
24
Cf. Centre for Evidence-Based Medicine. Disponível em http://www.cebm.net. Acessado em
04/07/2021.
Justo por isso, nem sempre o nível “1” de evidência é a solução mais apropriada para
certa questão, tendo em conta a variação de resultados na utilização de fármacos e de
tratamentos versáteis por práticas médicas aplicáveis em casos concretos. São comuns erros
por estimação do poder de resultados da randomização, atrelados à fronteira do ambiente
elegido, de modo que relatórios de nível elevado podem ser pouco efetivos, em face da
diferença entre grupos.25

A ciência, por isso, há de conviver com as possibilidades ou com resultados “não


previsíveis”, anotando justamente a hierarquia das evidências científicas em medicina,
confirmada por diversas espécies de “tabelas” produzidas por órgãos e entidades de suma
importância, o que reforça, portanto, o direito de o profissional de medicina, baseando-se em
elementos insertos como fontes para solução de problemas científicos, optar racionalmente
pelo conveniente.

Não à toa, no Código de Ética Médica, no inciso VII do Capítulo I, elenca-se como
princípio fundamental, a autonomia do médico para “analisar” um caso, optando, conforme
sua experiência clínica, por posições científicas que lhe pareçam mais apropriadas,
especialmente em situação de urgência, as quais são cridas por si como possivelmente
suficientes (enquanto alternativas), em respeito à sua consciência.26

Especialmente em relação à Pandemia COVID-19, deu-se amplíssima politização do


dito “tratamento precoce”, por meio de drogas produzidas para outras maleitas, mas que, por
estudos, ensaios clínicos e, principalmente, observação de casos vêm mostrando certo grau de
efetividade.

Nada obstante o referido tratamento constar com inúmeras drogas, “casos famigerados”
foram o da “ivermectina” - medicamento confeccionado para combate de parasitas
nematoides (Strongyloides stercoralis e Onchocerca volvulus), mas com efeitos antivirais
efetivos contra o COVID-19; o da “hidroxicloroquina” – fármaco para tratamento de

25
“This allows the reader to know the level of evidence of the research but the designated level of
evidence does always guarantee the quality of the research. It is important that readers not assume that level 1
evidence is always the best choice or appropriate for the research question (…). Although RCTs are the often
assigned the highest level of evidence, not all RCTs are conducted properly and the results should be carefully
scrutinized. Sackett stressed the importance of estimating types of errors and the power of studies when
interpreting results from RCTs. For example, a poorly conducted RCT may report a negative result due to low
power when in fact a real difference exists between treatment groups”. Centre for Evidence-Based Medicine.
Disponível em http://www.cebm.net. Acessado em 04/07/2021.
26
Capítulo I. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia,
não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje,
excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa
possa trazer danos à saúde do paciente.
afecções reumáticas e dermatológicas, artrite reumatoide, lúpus e malária por Plasmodium
Vivax, mas que, por diversos estudos, em dose escorreita, vinha mostrando-se benéfico para
tratamento inicial da maleita originada na China.

Sobre a ivermectina, interessante estudo promovido por Juan J. Chamie-Quintero,


Jennifer A. Hibberd, e David E Scheim nomeado “Sharp reductions in COVID-19 case
fatalities and excess deaths in Peru in close time conjunction, state-by-state, with ivermectin
treatments” demonstrou minoração de mortalidade em 2020, nos estados peruanos que
usaram ivermectina, comparando com Lima, onde a droga não foi usada, inclusive em face
das mutações. O estudo expõe que, uma vez prevalecida a “posição de Lima”, afastado o uso
da ivermectina, deu-se majoração acachapante das mortes por COVID.27

No artigo “Ivermectin for Prevention and Treatment of COVID-19 Infection: A


Systematic Review, Meta-analysis, and Trial Sequential Analysis to Inform Clinical
Guidelines American Journal of Therapeutics”, publicado no American Journal of
Therapeutics, de 17 de junho de 202128, comentado fora o caso do Peru, condicionando-o,
contudo, a uma análise conjunta do uso da droga com demais medidas preventivas.29

27
“For the 24 states of Peru with early IVM treatment, both excess deaths and COVID-19 case fatalities
dropped sharply over 30-45 days after peak deaths. Deaths fell as six indices of Google-tracked community
mobility rose over the same period. For nine states in which IVM was distributed over a short period through
operation MOT, excess deaths at +30 days dropped by a population weighted mean of 74%. Each drop began
within 11 day after MOT start. Several potential incidental causes of mortality reductions were ruled out. The
appropriate clinical follow-up to IVM treatments for COVID-19 in the 25 states of Peru, with a combined total
population of 33 million, is additional such national deployments, interim and complementary to full-scale
vaccine deployments. As noted, the exceptional record of this Nobel Prizehonored drug in 3.7 billion doses
worldwide since 1987 provides a backdrop of safety. IVM treatments offered early for symptomatic indications
of COVID-19 can fill in the gaps of vaccination protection, providing major mortality reductions for individuals
pending development of vaccine-generate antibodies. IVM is also likely to be effective against viral mutants, in
particular, the South African variant, that may receive a lesser degree of protection with current vaccines. Yet
with aggressive such complementary deployments of vaccinations and IVM, the risk of continued contagion
through complacency among individuals spurred by diminished mortality rates must be avoided. Public policies
of widespread, rapid testing, contact tracing and face coverings can ensure that both of these therapeutic tools,
vaccinations and IVM treatments, are optimally applied toward the complete elimination of the COVID-19
pandemic.” CHAMIE-QUINTERO Juan J. HIBBERD, Jennifer A., e SCHEIM David. Sharp reductions in
COVID-19 case fatalities and excess deaths in Peru in close time conjunction, state-by-state, with ivermectin
treatments. WORLD HEALTH ORGANIZATION – Global Literature on coronavirus disease.
28
https://journals.lww.com/americantherapeutics/abstract/9000/ivermectin_for_prevention_and_treatment_of.980
40.aspx. Acessado em 04/07/2021.
29
“There is also evidence emerging from countries where ivermectin has been implemented. For
example, Peru had a very high death toll from COVID-19 early on in the pandemic.128 Based on observational
evidence, the Peruvian government approved ivermectin for use against COVID-19 in May 2020.128 After
implementation, death rates in 8 states were reduced between 64% and 91% over a two-month period. Another
analysis of Peruvian data from 24 states with early ivermectin deployment has reported a drop in excess deaths
of 59% at 30+ days and of 75% at 45+ days. However, factors such as change in behavior, social distancing, and
face-mask use could have played a role in this reduction.” BRYANT Andrew, MSc. Ivermectin for Prevention
and Treatment of COVID-19 Infection: A Systematic Review, Meta-analysis, and Trial Sequential Analysis to
Inform Clinical Guidelines American Journal of Therapeutics.
Estribado em meta-análise (análise estatística de resultados de diferentes estudos
individuais), essa pesquisa ainda exalta a eficácia da ivermectina, por experiência de países
da América do Sul, de estados da Índia e, mais recentemente, da Eslováquia. Neles, viu-se
resultado positivo com minoração de mortalidade em 62%. O baixo custo da droga somado à
utilização de corticoides, em casos inflamatórios mais graves, conforme a conclusão
confirma-se como um instrumento público eficaz de combate à Pandemia COVID-19.30

Minoração robusta de morte por COVID-19 em 97% foi registrada em Deli, na Índia,
relacionada ao tratamento precoce e, mais especificamente, ao uso da ivermectina, conforme
notícia divulgada no “The Desert Review”: “Ivermectin obliterates 97 percent of Delhi
cases”, de 1 de junho de 202131, com base em relatos e pesquisas de Justos R. Hope, autor do
livro “Ivermectin for the World”.32

O “vermífugo” ivermectina mostrou-se redutor de 56% da mortalidade em casos


moderados e graves da COVID-19, segundo meta-análise publicada no artigo “Meta-analysis
of randomized trials of ivermectin to treat SARS-CoV-2 infection do Open Forum Infectious
Diseases”, Oxford Academic, de 6 de julho de 2021.33

30
“There are numerous emerging ongoing clinical trials assessing ivermectin for COVID-19. The trade-
off with policy and potential implementation based on evidence synthesis reviews and/or RCTs will vary
considerably from country to country. Certain South American countries, Indian states, and, more recently,
Slovakia and other countries in Europe have implemented its use for COVID-19. A recent survey of global
trends documents usage worldwide. Despite ivermectin being a low-cost medication in many countries globally,
the apparent shortage of economic evaluations indicates that economic evidence on ivermectin for treatment and
prophylaxis of SARS-CoV-2 is currently lacking (…) Given the evidence of efficacy, safety, low cost, and
current death rates, ivermectin is likely to have an impact on health and economic outcomes of the pandemic
across many countries. Ivermectin is not a new and experimental drug with an unknown safety profile. It is a
WHO “Essential Medicine” already used in several different indications, in colossal cumulative volumes.
Corticosteroids have become an accepted standard of care in COVID-19, based on a single RCT of
dexamethasone. If a single RCT is sufficient for the adoption of dexamethasone, then a fortiori the evidence of 2
dozen RCTs supports the adoption of ivermectin. Ivermectin is likely to be an equitable, acceptable, and feasible
global intervention against COVID-19. Health professionals should strongly consider its use, in both treatment
and prophylaxis”. Idem.
31
Disponível em https://www.thedesertreview.com/news/national/ivermectin-obliterates-97-percent-of-
delhi-cases/article_6a3be6b2-c31f-11eb-836d-2722d2325a08.html. Acessado em 5/7/2021.
32
Disponível em “amazon.com: Ivermectin for the World eBook: Hope, Justus, R: Kindle Store”.
Acessado em 5/7/2021.
33
“Ivermectin is an antiparasitic drug being investigated for repurposing against SARS-CoV-2.
Ivermectin showed in-vitro activity against SARS-COV-2 at high concentrations. This meta-analysis
investigated ivermectin in 24 randomized clinical trials (3328 patients) identified through systematic searches of
PUBMED, EMBASE, MedRxiv and trial registries. Ivermectin was associated with reduced inflammatory
markers (C-Reactive Protein, d-dimer and ferritin) and faster viral clearance by PCR. Viral clearance was
treatment dose- and duration-dependent. In 11 randomized trials of moderate/severe infection, there was a 56%
reduction in mortality (Relative Risk 0.44 [95%CI 0.25-0.77]; p=0.004; 35/1064 (3%) deaths on ivermectin;
93/1063 (9%) deaths in controls) with favorable clinical recovery and reduced hospitalization. Many studies
included were not peer reviewed and a wide range of doses were evaluated. Currently, WHO recommends the
use of ivermectin only inside clinical trials. A network of large clinical trials is in progress to validate the results
Não se pode deixar de lado experiência nacional do uso da ivermectina e do tratamento
precoce. Na cidade de Porto Feliz, fora criada “unidade sentinela”, com envio de casos
suspeitos. Após exames confirmatórios, seguiu-se protocolo, contando com tratamento inicial
composto por diversos medicamentos, incluindo a ivermectina. Somou-se a isso a distribuição
profilática de ivermectina para 4.500 pacientes e o uso por profissionais de saúde. O resultado
foi uma das menores taxas de mortalidade do país.34

Firmou-se, portanto, luta política e jurídica contra o “tratamento precoce”, na motriz da


“falta de comprovação científica em nível máximo” dos medicamentos para o tratamento de
COVID-19, firmando-se vergalhão de críticas, com potencial ameaça de ações judiciais,
contra a própria prescrição médica desses fármacos. Acontece que, simultaneamente a esse
“espetáculo” de ataque à autonomia médica, exigências acachapantes foram tomadas, tanto
por decisões judiciais, quanto por decretos estaduais e municipais, determinando o
fechamento de comércio, impondo restrições de convivência social e uso de máscaras.

Especialmente sobre o uso de máscaras sabe-se da existência de grande discussão


acadêmica acerca do grau de sua eficácia, considerando espécies de máscaras, modo e local
de utilização. Fora realizado um estudo, apresentado no artigo “Effectiveness of Adding a
Mask Recommendation to Other Public Health Measures to Prevent SARS-CoV-2 Infection in
Danish Mask Wearers”,35 por diversos estudiosos dinamarqueses, tratando de ensaio clínico
randomizado não cego, com aproximadamente 6.000 pessoas de mesma comunidade, em que
um grupo não usou máscaras, enquanto outro, usou máscara cirúrgica. O resultado foi o da
incerteza quanto ao grau de efetividade do uso de máscaras, tendo em conta que outros
mecanismos de controle são efetivamente utilizados junto com o uso das máscaras, dentre os
quais o distanciamento social e medidas de não-aglomeração. Assim, não houve certeza de
quão efetiva é a prática do uso de máscaras, considerando inúmeras variantes, passando da
qualidade da máscara, observando o local de uso, as peculiaridades sociais, os costumes de
cada comunidade, findando na própria estrutura arquitetônica das cidades.36

seen to date”. HILL, Andrew et al. Meta-analysis of randomized trials of ivermectin to treat SARS-CoV-2
infection.
34
Cf. Front Line COVID-19 Critical Care Alliance. Disponível em
https://covid19criticalcare.com/pt/ivermectina-em-covid-19/an%C3%A1lises-epidemiol%C3%B3gicas-em-
covid19-e-ivermectina/. Acessado em 05/07/2021.
35
Disponível em https://www.acpjournals.org/doi/full/10.7326/M20-6817?s=09&journalCode=aim.
Acessado em 04/07/2021.
36
“The potential benefits of a community-wide recommendation to wear masks include combined
prevention and source control for symptomatic and asymptomatic persons, improved attention, and reduced
potential stigmatization of persons wearing masks to prevent infection of others (17). Although masks may also
Doutra ponta, no artigo “The role of community-wide wearing of face mask for control
of coronavirus disease 2019 (COVID-19) epidemic due to SARS-CoV-2”,37 a conclusão dos
estudiosos chegou a uma solução contrária, com forte defesa da alta efetividade do uso de
máscaras (de qualquer espécie), diante de comparação de Hong Kong com outras
comunidades no entorno.38

Casuística siamesa envolve a elevação da vacinação a objeto de dever cívico, inclusive


com potencial criação de “passaporte de vacinação”, documento obrigatório para dirimir o ir-
e-vir das pessoas no país e no mundo. Ainda que se saiba da importância das vacinas, armas
prioritárias contra a maleita, é evidente que, pelo pouco tempo de produção e, sobretudo,
diante da utilização de novas tecnologias (como “RNA mensageiro da vacina da fabricante
Pfiser”), as vacinas distribuídas possuem caráter emergencial. Há relatos, pululando em
estudos vários, da ocorrência de efeitos adversos das vacinas, de pontual ineficácia,
principalmente as de primeira geração como a Coronavac, o que constitui ocorrência
naturalmente óbvia, dada a falta de testagem suficiente e de análises técnicas efetivas.

No artigo “Preliminary Findings of mRNA Covid-19 Vaccine Safety in Pregnant


Persons”, publicado no The New England Journal of Medicine, verificou-se que, a cada
quatro gestantes vacinadas com fármaco com a tecnologia RNAm, ao menos uma abortou,
teve parto prematuro ou bebê menor do que o esperado. Mesmo artigo diz que a vacinação
produziu aparente defesa orgânica aos neonatais, sobretudo, se ocorrida no primeiro trimestre.
Tudo isso, ilações sem dados concretos, sobre a real efetividade do fármaco.39

have served as source control in SARS-CoV-2–infected participants, the study was not designed to determine the
effectiveness of source control. (…) Reduction in release of virus from infected persons into the environment
may be the mechanism for mitigation of transmission in communities where mask use is common or mandated,
as noted in observational studies. Thus, these findings do not provide data on the effectiveness of widespread
mask wearing in the community in reducing SARS-CoV-2 infections. They do, however, offer evidence about
the degree of protection mask wearers can anticipate in a setting where others are not wearing masks and where
other public health measures, including social distancing, are in effect. The findings also suggest that persons
should not abandon other COVID-19 safety measures regardless of the use of masks. While we await additional
data to inform mask recommendations, communities must balance the seriousness of COVID-19, uncertainty
about the degree of source control and protective effect, and the absence of data suggesting serious adverse
effects of masks”. BUNDGAARD Henning, DMSc et al. Sharp reductions in COVID-19 case fatalities and
excess deaths in Peru in close time conjunction, state-by-state, with ivermectin treatments.
37
Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32335167/. Acessado em 04/07/2021.
38
“Conclusion: Community-wide mask wearing may contribute to the control of COVID-19 by reducing
the amount of emission of infected saliva and respiratory droplets from individuals with subclinical or mild
COVID-19.” CHENG Vincent Chi-Chung et al. The role of community-wide wearing of face mask for control of
coronavirus disease 2019 (COVID-19) epidemic due to SARS-CoV-2.
39
“During the analysis period, the VAERS received and processed 221 reports involving Covid-19
vaccination among pregnant persons; 155 (70.1%) involved nonpregnancy-specific adverse events, and 66
(29.9%) involved pregnancy- or neonatal-specific adverse events (Table S4). The most frequently reported
pregnancy-related adverse events were spontaneous abortion (46 cases; 37 in the first trimester, 2 in the second
Outro artigo intitulado “Necessity of COVID-19 vaccination in previously infected
individuals”, um pré-print do MedRxiv – BMJ Yale – site de distribuição de artigos em vias
de publicação em revistas e jornais científicos internacionais – da labuta de médico-
pesquisador do Departamento de Doenças Infecciosas, Prevenção de Infecção, Ciências
Quantitativas de Saúde e Saúde Ocupacional de Cleveland, Ohio, sustenta a falta de
evidências sobre a eficácia da vacinação contra COVID-19, em pessoas que já tiveram a
doença.40

Do mesmo site técnico acima citado, no artigo “Effectiveness of the CoronaVac vaccine
in the elderly population during a P.1 variant-associated epidemic of COVID-19 in Brazil: A
test-negative case-control study”, de estudiosos integrantes da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul entre outros, demonstrou-se a redução da efetividade da vacina Coronavac, na
medida em que é aplicada em grupos mais longevos. Insta curiosamente citar que as
“inicialmente priorizadas” foram pessoas mais velhas.41

Os exemplos acima confirmam a incerteza sobre os efeitos e a eficácia de


medicamentos, de vacinas e de práticas de profilaxia, em face de patógeno novíssimo, como o
responsável pela COVID-19, corroborando a imprevisibilidade, característica do conceito de
ciência. Prova-se a impossibilidade de se promover qualquer limitação a Direitos
Fundamentais, como a liberdade de escolha e a de ir-e-vir, com base em práticas que ainda

trimester, and 7 in which the trimester was unknown or not reported), followed by stillbirth, premature rupture of
membranes, and vaginal bleeding, with 3 reports for each. No congenital anomalies were reported to the
VAERS, a requirement under the EUAs. (…) In addition to vaccination protecting women against Covid-19 and
its complications during pregnancy, emerging evidence has shown transplacental transfer of severe acute
respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV-2) antibodies after maternal Covid-19 vaccination during the
third trimester, which suggests that maternal vaccination might provide some level of protection to the
neonate.29-32 However, we do not have data on antibody transfer and level of protection relative to the timing
of vaccination. The CDC and the FDA are continuing to monitor and disseminate information about the safety of
mRNA and additional types of Covid-19 vaccines in pregnant persons.” SHIMABUKURO, Tom T., M.D et al.
Preliminary Findings of mRNA Covid-19 Vaccine Safety in Pregnant Persons. Preliminary Findings of mRNA
Covid-19 Vaccine Safety in Pregnant Persons, NEJM.
40
“It is reasonable to expect that immunity acquired by natural infection provides effective protection
against future infection with SARS-CoV-2. Observational studies have indeed found very low rates of
reinfection over the following months among survivors of COVID-19 [6–8]. Reports of true reinfections are
extremely rare in the absence of emergence of new variants. When such reinfections occur, it would be purely
speculative to suggest that a vaccine might have prevented them. Duration of protective immunity from natural
infection is not known. However, the same also can be said about duration of protective immunity from
vaccination. Uncertainty about the duration of protective immunity afforded by natural infection is not by itself a
valid argument for vaccinating previously infected individuals. This study provides direct evidence that
vaccination with the best available vaccines does not provide additional protection in previously infected
individuals.” NABIN K. Shrestha et al. Necessity of COVID-19 vaccination in previously infected individuals.
41
Cf. Effectiveness of the CoronaVac vaccine in the elderly population during a P.1 variant-associated
epidemic of COVID-19 in Brazil: A test-negative case-control study. RANZANI Otavio T. et al. Disponível em:
Effectiveness of the CoronaVac vaccine in the elderly population during a P.1 variant-associated epidemic of
COVID-19 in Brazil: A test-negative case-control study (medrxiv.org). Acessado em 07/07/2021.
integram patamar de prevalência substancial de incerteza científica. Pensar diferente é atribuir
a uma opinião científica o status de poder de império, indelével arbitrarismo.

No que toca à vacinação e ao uso de máscaras, tais práticas foram consideradas deveres
de todo cidadão e passíveis de serem consideradas pré-requisitos para exercer direitos.
Optaram o Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e a Comunidade Médica em geral, com
auxílio da mídia, em considerá-los fundados em “imperatividade”, com possível aplicação de
sanções, em caso de descumprimento, pré-julgando-os em irrefutáveis evidências científicas,
ainda que claramente constituam temas postos em xeque em diversos estudos.

Assemelhado tratamento, no entanto, não foi dado para o uso off label dos
medicamentos componentes do dito “tratamento precoce”, eis que exatamente como a
efetividade e os efeitos das vacinas e o uso de máscaras também não possui justificativa
sustentada por evidências científicas de grau máximo, mas, diferente delas, foi politicamente
“rotulado” como deliberado equívoco e prática viciada, passível de potencial condenação.

O que se vê, por isso, é férrea oposição política à medicina baseada em evidências,
pondo de lado a potencial eficácia dos medicamentos, sob a labuta da ausência de
comprovação científica, desconsiderando a expertise técnica, o histórico clínico do médico,
estudos presentes em pré-prints e publicados em revistas científicas, revisados por pares,
alcançando graus relevantes na escala de evidências.

Quanto ao uso precoce da hidroxicloroquina, a descrença da eficácia em momentos


iniciais para minorar efeitos maléficos sob a argumentação da “falta de evidências” perdurou
deveras. O Conselho Nacional de Medicina publicou o Parecer nº 4/2020, não apoiando nem
condenando tratamento precoce ou cuidados farmacológicos, tampouco invalidando
protocolos clínicos de sociedades especializadas, mas, antes de tudo, defendendo a autonomia
do médico e do paciente para, juntos, tomarem as decisões que lhes parecessem mais
apropriadas.42 Obviamente a medicina baseada em evidências com respeito à autonomia

42
“Com base nos conhecimentos existentes relativos ao tratamento de pacientes portadores de COVID-19
com cloroquina e hidroxicloroquina, o Conselho Federal de Medicina propõe: a) Considerar o uso em
pacientes com sintomas leves no início do quadro clínico, em que tenham sido descartadas outras viroses (como
influenza, H1N1, dengue), e que tenham confirmado o diagnóstico de COVID-19, a critério do médico
assistente, em decisão compartilhada com o paciente, sendo ele obrigado a relatar ao doente que não existe até o
momento nenhum trabalho que comprove o benefício do uso da droga para o tratamento da COVID-19,
explicando os efeitos colaterais possíveis, obtendo o consentimento livre e esclarecido do paciente ou dos
familiares, quando for o caso; (…) d) O princípio que deve obrigatoriamente nortear o tratamento do paciente
portador da COVID-19 deve se basear na autonomia do médico e na valorização da relação médico-paciente,
sendo esta a mais próxima possível, com o objetivo de oferecer ao doente o melhor tratamento médico
disponível no momento; e) Diante da excepcionalidade da situação e durante o período declarado da pandemia,
não cometerá infração ética o médico que utilizar a cloroquina ou hidroxicloroquina, nos termos acima expostos,
médica possui reflexos de ordem pública, eis que a eficácia gera minoração de mortes,
afetando o interesse difuso.

No tocante a esta problemática, o Ministério Público de Goiás publicou a Nota Técnica


nº 001, de 24 de fevereiro de 2021, com amplíssimo estudo com pré-prints, opinião de
experts, cabalmente defendendo a autonomia médica para o uso de diversos medicamentos
para tratamento inicial de COVID-19, dentre os quais a ivermectina e a
cloroquina/hidroxicloroquina.

Na nota, além das inúmeras referências técnicas sobre grau de certeza quanto à eficácia
do tratamento precoce, indica o Ministério Público de Goiás que o combate “integral” da
doença: por vacinação efetiva, por medidas profiláticas, por tratamento inicial e precoce são
medidas de conjunto complexo de estratégia de defesa da saúde, função primaz do
Administrador Público.43

Opor-se ao uso de medicamentos “off label”, sob a alegação da falta de “evidências


científicas máximas”, e, ao mesmo tempo, defender medidas de contenção do vírus, como a
vacinação obrigatória, o fechamento de comércio e o uso indiscriminado de máscara em
qualquer lugar (práticas que não possuem máximo grau de validade científica), significa, além
de coroar a incoerência, achacar princípios fundamentais como a liberdade do particular e o
respeito ao interesse público.

3. Cautela em Direito Sanitário em tempos de Pandemia.


No contexto do império das “narrativas políticas”, amplamente difundidas pelos
tendenciosos meios de comunicação em massa, houve o etiquetamento daqueles que
defendem o tratamento precoce ou imediato como “negacionistas”. Criou-se virtual dicotomia
entre “tratamento versus vacina”, instigando a opinião pública com falta de lealdade.
Em direito sanitário, notadamente em estados de epidemia ou pandemia, todas as
“armas” devem ser exploradas e eficazmente usadas, em defesa da vida e da saúde individual
e coletiva, a saber, a precaução, a prevenção e o tratamento pautados por evidências
científicas e observados pelo Poder Público.

em pacientes portadores da COVID-19.” Disponível em:


https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/BR/2020/4. Acessado em 04/07/2021.
43
“O papel da administração pública frente à primeira onda é promover um combate integral à doença,
que consiste num conjunto complexo e integrado de ações, estratégias e serviços que devem ser coordenados,
operacionalizados e implementados no âmbito da assistência (em seus 3 níveis), vigilância em saúde
epidemiológica, laboratorial e saúde do trabalhador) e desenvolvimento científico/tecnológico com o objetivo de
aumentar possibilidades de prevenção (medidas não farmacológicas e imunizações), tratamento inicial e
tratamento tardio, além de reabilitação dos pacientes que foram infectados e sofreram sequelas.” Ministério
Público de Goiás. Nota Técnica 001/21.
A epidemiologia é baseada na ciência, não em discursos políticos de mera retórica,
conforme peculiares interesses eleitoreiros, de modo que a polarização política há de recolher-
se a seus redutos naturais, abster-se de produzir desserviços sociais. Por esse motivo, é preciso
entender o fenômeno da politização da ciência, como instrumento político-jurídico, na ótica
da (im)probidade administrativa, por conhecidos preceitos jurídicos: precaução e prevenção.
A precaução consiste em antecipar-se ao fato, fincando-se na proteção contra o risco.
No trato da pandemia, é o desenvolver de condutas para reduzir o risco pessoal e coletivo de
contaminação, minorando a carga viral de contaminação do organismo humano.
Desenvolvem-se medidas não-farmacológicas de distanciamento social, o uso de máscara, a
etiqueta respiratória, a constante higienização das mãos, tudo visando à redução dos fatores de
risco e de exposição viral.
A prevenção implica na adoção antecipada de mecanismos voltados para evitar a
ocorrência de dano concreto, agindo-se antecipadamente. Significa imunização populacional,
por vacinas indutoras da criação de anticorpos pelo sistema imunológico, afastando evoluções
para quadros mais graves.44
O tratamento prévio não se confunde absolutamente com as etapas citadas pelos dois
preceitos, nada obstante ser espécie de medida preventiva, não excludente das vacinas. O
médico assiste o paciente na fase ambulatorial e no internamento hospitalar, ministrando-lhe
medicamentos adequados ao alívio dos sintomas, protegendo órgãos afetados, inibindo a
replicação viral.
A Constituição Federal, no art. 196, confirma os três direcionamentos, preceituando que
as políticas de saúde visam redução do risco da doença (precaução), proteção (prevenção) e
recuperação (tratamento) da saúde das pessoas. O vírus SARS-CoV-2 é transmitido por
gotículas respiratórias, aerossóis produzidos, quando infectado tosse ou espirra, de modo
assemelhado ao vírus influenza e a outros patógenos respiratórios, todos na dependência de
contatos próximos.45 A precaução à infecção visa justamente evitar exposição ao vírus,
mediante adoção das chamadas medidas não-farmacológicas, notadamente o distanciamento
social, o uso obrigatório de máscaras. Ainda que existam controvérsias quanto à eficácia
desses métodos e a desnecessidade do uso de máscaras em locais abertos, a obrigatoriedade
indiscriminada foi imposta à sociedade.
A prevenção, por seu turno, é concebida como proteção prévia, mediante anticorpos,

44 CONASS. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Vacinação contra a COVID-19: segurança e


eficácia das vacinas.
45 BRASIL. Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico COE-nCoV nº 03.
“blindando” o organismo em contato com vírus, sendo socialmente aceita, dado o histórico
brasileiro de imunização e a cultura da vacinação. Apesar de não existir comprovação
científica em grau superior “A”, as autoridades sanitárias e judiciárias vêm atuando de
maneira açodada, na imposição coercitiva de imunizantes à população. Não se percebe
comprovação da segurança e, muito menos, da eficácia das vacinas, todas no aguardo de
estudos definitivos. O grau de eficácia de cada imunizante é incógnita global, havendo
notificações, após uso do fármaco imunizante, de casos graves, até óbitos por coágulo,
miocardite, pericardite e associações com síndromes degenerativas como a de Guillain-Barré.
A Lei nº 13.979/20, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de
saúde pública decorrente dos efeitos pandêmicos, traz, em seu art. 3º, III, “d”, a possibilidade
de adoção da realização compulsória de vacinação e de medidas profiláticas. O texto
corrobora a Lei nº 6.259/75, sobre o Programa Nacional de Imunizações, em que já se previa,
nos arts. 3º e 5º, o caráter obrigatório da vacinação populacional, comprovado por atestado de
vacinação. A leitura dessas duas normas mostra o consenso científico sobre a licitude da
obrigatoriedade, desde que amparada na garantia da segurança e na eficácia do imunizante.
Vacinas em fase de testes não se enquadram no objeto da lei 6.259/75, pois não se podem
promover experiências científicas, tendo a população como cobaia. E essa circunstância vem
promovendo majoração potencial de abuso a direitos civis, sobretudo pelo Senado Federal..
O Projeto de Lei nº 5.555/20 torna criminoso quem não se submeta à vacinação
obrigatória. A pena proposta é assemelhada à imputada a crimes como lesão corporal
gravíssima, sequestro com grave sofrimento físico e moral, redução à condição análoga a
escravo, tráfico de pessoas, furto qualificado, receptação qualificada, favorecimento à
prostituição qualificada. O Projeto de Lei nº 1.674/21 fixa o “passaporte COVID”,
restringindo o direito de locomoção, o acesso a prédios públicos e privados, constando
expressamente exceções à locomoção interestadual e intermunicipal, vedação à utilização de
meios de transporte coletivo, ingresso em hotéis, parques, reservas naturais. O Projeto de Lei
nº 2.439/21 traz a figura da dispensa por justa causa do empregado que se recusar ao
recebimento de imunização, mediante vacina. O fim desses Projetos de Lei citados é um:
cidadão que pretender exercer suas liberdades civis, o direito de autodeterminação, não se
submetendo às vacinas, terá sua liberdade de locomoção mutilada, perderá o emprego, será
criminoso.
Na contramão, na Câmara dos Deputados, tramitam os Projetos de Lei nº 4.506/20 e
5.411/20 que pretendem afastar a compulsoriedade da vacinação. O primeiro altera a al. “d”
do inc. III, do art. 3º, da Lei 13.979/20; o segundo revoga todas as disposições do inc. III do
art. 3º, da Lei nº 13.979/20. A justificativa central advoga pela preservação das liberdades
individuais: “os que estão pedindo mais interferência dos governos estão pedindo, em última
instância, mais coerção e menos liberdade”.46
A obrigatoriedade de vacinação, em contexto de calamidade pública, ocasionada pela
pandemia viral, eclodiu, por provocação do STF, no exercício de controle concentrado da
constitucionalidade do art. 3º, III, “d”, da Lei nº 13.979/20. No julgamento conjunto das
ADIs nº 6.586 e 6.587, transitadas em julgado, o STF47 optou-se por permitir a violação dos
direitos humanos dos cidadãos, sujeitando-os à obrigação de imunização compulsória,
mediante vacinas cientificamente carentes de segurança e eficácia. Essa decisão enfraqueceu
os projetos de lei da Câmara dos Deputados, fortaleceu os do Senado Federal. Pontuou a
Corte que a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir o
consentimento do usuário. Vale sua implantação, por medidas indiretas: a restrição ao
exercício de atividades ou à frequência em determinados lugares, desde que previstas em lei,
ou delas decorrentes, implementadas pela União, pelos Estados, Distrito Federal e pelos
Municípios, segundo suas respectivas esferas de competência.
Com a chancela do Supremo, ofenderam-se os direitos humanos chamados de primeira
geração (primeira dimensão), conquista histórica do cidadão para conter o poder estatal. As
liberdades civis são consideradas direitos de cunho negativo, com finalidade de não
intervenção do Estado na esfera dos direitos individuais: “são direitos que garantem aos
indivíduos a deliberação de seus próprios interesses, sem a possibilidade de intervenção
estatal.”48
A Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano,
face às Aplicações da Biologia e da Medicina, estabelece que “o interesse e o bem-estar do ser
humano devem prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência” (art. 2º);
protege a liberdade da pessoa, diante da submissão a uma intervenção: “Qualquer intervenção
no domínio da saúde só pode ser efetuada após ter sido prestado pela pessoa em causa o seu
consentimento livre e esclarecido”.
Os direitos humanos, conforme Canotilho, são originários “da própria natureza humana,

46 Inteiro teor e justificativa do autor do projeto, que cita Ludwig von Mises, está disponível em
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2266196. Acesso em 17/07/21.
47 STF, ADI 6586, Relator(a): Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2020, Processo
Eletrônico, Dje-063, DIVULG 06-04-2021, PUBLIC 07-04-2021.
48 HONESKO, Raquel Schlommer. Discussão histórico-jurídica sobre as gerações de direitos
fundamentais: a paz como direito fundamental de quinta geração. In FACHIN, Zulmar (coord.). Direitos
Fundamentais e Cidadania. São Paulo: Método, 2008. p. 190.
daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal”49. São intrínsecos, inseparáveis do ser,
não passíveis de serem vilipendiados pelo Estado. Respeitar a autonomia da vontade, diante
de imunizantes, ainda em fase de estudos, é salvaguardar a dignidade humana, o que mostra
medidas indiretas e restritivas como insuportáveis ofensas a direitos humanos.
Consequência axiológica dessa obrigação é a criação de “cidadania de vacinados”,
concedida aos que, mesmo não coagidos fisicamente à vacinação forçada, restaram premidos
pelas restrições a liberdades civis, isto é, limitação de acessos e de exercício prático de
direitos. Eis, aqui, a coação moral atentatória à autonomia de escolha, consistindo na
extrapolação dos limites impostos ao Estado sobre a liberdade individual.
O Estado empurra a vacinação desenfreada em massa, podendo firmar ao “não
vacinado” condição análoga a um pária, impuro excluído do convívio social, daí cediço que
os movimentos legislativos do Senado Federal e decisão do Supremo estão em desalinho com
a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos que garante os “interesses e o
bem-estar do indivíduo como prioridade sobre o interesse exclusivo da ciência ou da
sociedade” (art. 3º).
O Código de Nuremberg, de 1947, que julgou vinte e três pessoas, vinte das quais,
consideradas criminosas de guerra, pelos brutais experimentos realizados em seres humanos,
conceituou o consentimento voluntário como absolutamente essencial, sendo que “essas
pessoas devem exercer o livre direito de escolha, sem qualquer intervenção de elementos de
força, fraude, mentira, coação, astúcia ou outra forma de restrição posterior”.50 No
enfrentamento da PANDEMIA, pelo decidido pelo STF, não se percebe o consentimento
informado. Vigora a imposição estatal, por coação moral – medidas restritivas indiretas
autorizadas aos gestores públicos.
Autonomia negligenciada é a prerrogativa que o indivíduo tem para decidir o que
entende melhor para si, diante de quadro de incertezas científicas em torno da COVID-19, da
segurança e eficácia das vacinas, faltando-lhe a opção em ser vacinado ou no uso de fármacos
que compõem o coquetel de tratamento imediato.
Recomendações válidas para qualquer enfermidade apontam que o tratamento inicial
alcança resultados minimizadores de sequelas, por isso conduta equivocada, em se tratado da
COVID-19, é aguardar a evolução máxima dos sintomas para, somente depois, procurar
auxílio médico.

49 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra:
Almedina, 1998. p. 359.
O cenário é teratológico: não há medicamentos aprovados, com indicação expressa em
bula para tratamento da COVID-19, o Remdesivir é único fármaco autorizado para uso
hospitalar, de aplicação intravenosa, recomendado a internados com pneumonia51 e os demais
medicamentos compõem o dito tratamento precoce, receitado (e rejeitado) por inúmeros
médicos brasileiros, de uso off label. A título de exemplo, nesse grupo, destacam-se
Nitazoxanida, Fluvoxamina, Budesonida inalatória, Corticoide, Colchicina, Azitromicina,
Ivermectina, Hidroxicloroquina, além de substâncias de reforço ao sistema imunológico,
como Zinco e Vitamina D.
A ausência de indicação expressa em bula não impede que médicos optem por uso
reposicionado de medicamentos, conforme estabelecem preceitos da ética médica, no
escorreito cumprimento do Juramento de Hipócrates: “Aplicar os tratamentos para ajudar os
doentes conforme minha habilidade e minha capacidade, e jamais usá-los para causar dano ou
malefício.”52 Eis a autonomia e a liberdade profissional, no exercício da medicina, liberdade
garantida por “duas vias”, pois o paciente pode voluntariamente sujeitar-se ou não ao
tratamento, conforme estabelece o Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 1.931/09).
Por isso o tratamento off label é indispensável ferramenta de política pública, pois
pautado pela ética, pela autonomia médica, na busca do melhor tratamento com drogas
disponíveis, respeita a liberdade de escolha do paciente, a autonomia do médico e a medicina
baseada em evidências.
No Sistema Público de Saúde, influído por interesses ideológicos baixos, médicos são
coibidos – direta e indiretamente – de receitar o tratamento inicial. Pacientes do SUS ficam a
mercê dos Gestores Públicos, ausentes medicamentos disponíveis, com alegação de “falta de
eficácia” ou de “comprovação científica”. A situação chega ao ápice, com penalidades
impostas a quem opte por inserir, em seu sistema, as drogas citadas, como ocorreu no
Município de Paranaguá, em que agentes públicos foram condenados ao pagamento de multa,
pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná, no Processo nº 480.881/20, de Tomada de
Contas Extraordinária (Acórdão nº 338/21), em razão da aquisição do fármaco ivermectina
para o combate à COVID-19. A justificativa da pena foi literal: “em razão da ausência de
comprovação da eficácia da medida adotada e, consequentemente, da ilegitimidade da

51 https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-03/anvisa-esclarece-divergencia-com-oms-sobre-
uso-do-rendesivir. Acessado em 09/07/2021.
52 REZENDE, Joffe Marcondes de. À sombra do plátano: crônicas de história da medicina [online]. São
Paulo: Editora Unifesp, 2009. O juramento de Hipócrates. pp. 31-48.
despesa”.53 No entanto, diante do avanço das pesquisas científicas, como citado em item
anterior, a ivermectina, plenamente eficaz no tratamento do novo Coronavírus, é fato que o
TCE/PR se posicionou por narrativas, não observou dever de cautela no trato de questões
sensíveis e no interesse difuso e coletivo.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 500 de Repercussão Geral (RE
657.718), firmou a tese de que, como regra geral, o Estado não pode ser condenado, por
decisão judicial, a fornecer medicamentos sem registro na ANVISA, portanto experimentais.
A decisão não pode ser aplicável, quando a omissão é na aquisição e no fornecimento de
medicamento “com registro” e para uso off label. Há decisões posteriores do STF aquiescendo
à possibilidade de tratamentos off label pelo SUS, não se enquadrando na tese do Tema 500
(RE 1.308.073, Relatora: Min. Cármen Lúcia, Julg. 05/03/2021; RE 1.282.257, Relator: Min.
Edson Fachin, Julg. 16/10/2020).
Em recentes decisões de casos envolvendo especificamente o fornecimento de
fármacos, mediante receita médica, a pacientes infectados pelo COVID-19, o STJ, no AgInt
no CC 172.061 e no no AgInt no CC 172.502, esclareceu ser o fornecimento de
medicamentos registrados na ANVISA, e não indicados para o tratamento de pacientes
infectados pelo COVID-19, o que caracteriza a pretensão de uso off label do fármaco.
Confirmou que o STF, no julgamento do RE 657.718 (Tema 500 de Repercussão Geral), só se
refere a medicamentos sem registro na ANVISA. Pela leitura dos julgados, resta evidente a
permissibilidade do fornecimento pelo SUS de todos os medicamentos reposicionais para o
tratamento da COVID-19, registrados na ANVISA, devidamente receitados por médico.
Importante inovação de lege ferenda é o Projeto de Lei nº 1.613/21, em trâmite na
Câmara dos Deputados, com regime de urgência. O texto visa alterar a Lei nº 8.080/90 para
expressamente permitir o uso de medicamentos reposicionados (off label), quando
devidamente registrados na ANVISA, “uma vez que não há interesse dos fabricantes em
promover novos testes e modificar as bulas atuais, como preconizam as exigências
54
regulatórias vigentes” . Destaca-se que a norma ampara medicamentos sem patente, como
a ivermectina e a hidroxicloroquina.
Diante de todo o quadro de incertezas que cerca “o tema COVID-19”, o único ponto que
já deveria estar pacificado é o da defesa dos direitos humanos e fundamentais, especialmente

53 Disponível em
http://servicos.tce.pr.gov.br/servicos/srv_consultaprocesso.aspx?processoMaster=48088120
54 Cf. Parecer de Plenário pelas Comissões de Seguridade Social e Família e de Constituição Justiça e de
Cidadania ao Projeto de Lei nº 1.613, de 2021.
a vida, a saúde e a liberdade individual. A contaminação política da saúde pública e do Direito
Sanitário eclode em incertezas e em insegurança social.

Conclusão.

A ciência experimental, durante a modernidade, alcançou grau de segurança técnica


com efeitos utilitários evidentes, sobretudo na órbita da medicina. No entanto, o método
científico limita-se ao ambiente e aos fatos por si analisados, fornecendo respostas certas para
problemas presentes, e que certamente sofrerão releituras e revisões futuras.
A ciência empírica relaciona-se indelevelmente com a incerteza, com o probabilismo e
com a mutabilidade, aspectos qualitativos, tensionando experiências científicas e
amalgamando valores pelo fenômeno do homem consciente do mundo que o cerca.
Com essa percepção, em ambiente pandêmico, resta evidente que a opinião das
autoridades científicas e políticas deve ser mitigada pela observação dos fatos, pela oitiva de
todos os agentes que atuam na realidade, no cotidiano do enfrentamento do vírus.
Não se pode arbitrariamente desconsiderar soluções de superação precoce do
Cororonavírus, com drogas reposicionadas, sob a alegação de “falta de evidências científicas
em grau máximo”, e, contraditoriamente, conceberem-se como justas medidas draconianas
que atentam contra a liberdade do indivíduo de ir e vir ou que lhes imponham vacinas em fase
de testes, igualmente inanes da mesma certeza científica que justificou a negativa das drogas
reposicionadas do tratamento precoce.
Certo grau de incerteza é condição elementar dos estudos científicos. Há de gestores
públicos, juristas e aplicadores da norma optarem por notas impositivas, por decisões
específicas, pautadas na indelével condição humana, o respeito à vontade e à liberdade, que
são vetustos preceitos garantidos por leis e por tratados internacionais atinentes aos Direitos
Humanos.
Impositivo é o mitigar da consideração dos resultados das ciências laboratoriais, com o
peso indelével da coerção jurídico-legal, atentando contra a natureza propriamente humana,
transformando homens em cobaias, sob a pena de a ciência assumir status de opressora,
considerando pessoas como autômatos e a esperança da vida, mera paisagem dos
especialistas.

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