Sie sind auf Seite 1von 12

A Produção Enxuta e Novos Padrões de Fornecimento em Três Montadoras de Veículos no

Brasil1

1. Introdução

A indústria automotiva é uma das atividades mais importantes de geração de renda, emprego e
investimentos do século 20. De um modelo tipicamente Fordista, esta indústria alcançou um padrão
mundial que vem sofrendo mudanças ao longo dos anos, principalmente no sentido de reduzir, ao
máximo, os desperdícios de valor.

O modelo desenvolvido por Henry Ford, nos Estados Unidos, possibilitou a produção em
massa. O Fordismo era caracterizado pelo grande volume de unidades produzidas, utilização de mão-
de-obra pouco qualificada e, no âmbito organizacional, a empresa era responsável pela execução de
todas as etapas de elaboração do produto. Esse modelo permitiu o crescimento da indústria
automotiva, não somente pelo aumento da escala de produção, mas também pela conseqüente
diminuição nos custos. Após a Segunda Guerra Mundial, as técnicas de Ford foram difundidas para
outros países, ampliando o alcance desta indústria e abrindo espaço para inserção de novas técnicas.

A crise do petróleo, em 1973, e a entrada de empresas japonesas neste mercado mostraram a


necessidade de reestruturação da indústria. As empresas japonesas apresentaram uma nova forma de
produção que ficou conhecida como “Sistema Toyota de Produção”, pois foi desenvolvido
pioneiramente pela Toyota. Esse sistema procurava atender a demanda do mercado, isto é, a produção
deveria estar vinculada às exigências do cliente, surgindo, assim, a necessidade de relacionamento
estreito entre as empresas montadoras e seus fornecedores. Ao contrário da competição entre empresas
para o fornecimento de peças e componentes às montadoras, que ocorria no Fordismo, o modelo
japonês incentivou a formação de parcerias entre empresas e relações de longo prazo.

O sucesso do modelo japonês acabou por difundi-lo em todo o mundo, tornando-se um novo
paradigma a ser superado. O desenvolvimento deste modelo permitiu o surgimento do sistema
chamado de “produção enxuta” ou lean production.

A produção enxuta é um sistema integrado de princípios, práticas operacionais e ferramentas


que habilitam e orientam a busca pelo que agrega valor ao consumidor. Essa busca pode ser traduzida
através da melhor alocação dos recursos disponíveis (maquinaria, pessoal e organização do lay out),
qualificação da mão-de-obra, redução de estoques e racionalização do tempo com conseqüente
redução de custos. O próprio desenvolvimento da produção enxuta permitiu, ainda, um novo padrão de
relacionamento entre montadoras e fornecedores, como entrega seqüenciada, difusão do just-in-time,
kanban e EDI (Eletronic Data Interchange), entre outros.

A proposta deste trabalho é discutir a produção enxuta e os novos padrões de fornecimento a


partir dos exemplos das formas produtivas desenvolvidas pela Mercedes-Benz/São Bernardo do
Campo, pela Volkswagen/Resende e pela General Motors/Gravataí. Para tanto, o artigo foi organizado
da seguinte forma: apresentação dos elementos da produção enxuta e discussão dos novos padrões de
fornecimento (seção 2), descrição de três exemplos de empresas que estão adotando as novas formas
produtivas (seção 3) e, posteriormente, serão feitos os comentários finais sobre o trabalho (seção 4).

1
Este artigo integra as atividades do Projeto CARS (NITEC/PPGA/UFRGS), iniciadas em 1998 com financiamento do
PADCT III. Os autores agradecem a Maria Letícia Sousa Correia Lima mestranda NITEC/PPGA/UFRGS.

1
2. A Produção Enxuta e os Novos Padrões de Fornecimento

Segundo a produção enxuta, desperdício é tudo aquilo que não agrega valor: tempo de espera
de um funcionário para que outro conclua a etapa anterior, estoque de produtos, deslocamento
desnecessário de pessoas e maquinaria, produção de itens indesejáveis, funcionários ociosos (Womack
& Jones, 1998). Da procura pela minimização e/ou eliminação do desperdício passa-se a analisar o que
"agrega valor" dentro do processo produtivo, ou seja, aplica-se o princípio da produção enxuta.

Em linhas gerais, a aplicação dos princípios de produção enxuta inicia-se na própria produção
e na busca por menos desperdícios. Novas técnicas de gestão, tais como MASP, PAPP, CEP, kanban,
JIT, enfim o conjunto de ferramentas que visam estabelecer um sistema amplo de qualidade, têm sido
aplicados com sucesso. Os ganhos de qualidade, produtividade e, consequentemente, de rentabilidade
são incontestáveis.

O processo de identificação dos pontos de desperdício está, no entanto, além das etapas de
produção. Trata-se de um conjunto de ações que envolve não só a totalidade da empresa, mas vai da
matéria-prima ao produto final.

É importante no processo enxuto que haja integração de todos dentro da empresa, desde os
funcionários de chão de fábrica até os altos cargos executivos. Neste sistema, os problemas não são
isolados, qualquer defeito na linha de produção influencia o andamento das outras etapas e deve ser
repensado e solucionado de maneira que todos se envolvam e nenhuma outra parte do processo seja
prejudicada. Solucionar um novo problema pode significar agregação de valor.

Desta forma, fornecedores de matéria-prima, de peças e componentes, montadoras e


distribuidores compõem uma cadeia de valor, ou seja, diferentes etapas de um processo que permite
agregar valor a um produto e/ou serviço. Nesta cadeia, cada etapa deve estar perfeitamente integrada,
mesmo que separadas geograficamente. Por trás desta está, na realidade, um importante fluxo de
informações.

O fluxo de informações estimula a comunicação entre as empresas, tornando-as mais


transparentes, facilitando a solução de problemas e estimulando o surgimento de idéias para a redução
de custos. Tais comunicações estão assumindo formato digital nas redes. As tecnologias de informação
estão deixando de ser caso isolado de organizações-chave para chegar aos clientes, fornecedores e
outros parceiros.

Segundo Tapscott (1997), a nova empresa é uma organização em tempo real, que se ajusta
contínua e imediatamente às novas condições comerciais por meio do imediatismo das informações.
As mercadorias são recebidas dos fornecedores e os produtos despachados aos clientes just-in-time,
reduzindo ou eliminando assim a função do armazenamento e permitindo às empresas deixar para trás
a produção em massa e entrar na produção puxada. Os pedidos dos clientes chegam eletronicamente e
são processados instantaneamente; as faturas correspondentes também são enviadas eletronicamente e
os bancos de dados são atualizados. É, em suma, a virtualização da cadeia enxuta: estas tendências já
são consideradas como requisitos obrigatórios para a consolidação de uma cadeia automotiva.

Neste processo de integração, as montadoras ficam responsáveis pelas etapas de concepção e


desenvolvimento de novos produtos, cabendo aos fornecedores diretos (os sistemistas), entregar peças
e módulos completos. Aos fornecedores de segundo e terceiro nível resta produzir peças para os
sistemistas. As montadoras estão reservando as atividades de maior valor agregado para si,
transferindo as demais atividades para o resto da cadeia de fornecimento, descentralizando as
atividades e qualificando seus parceiros.

2
Com a entrega de módulos completos, o sistemista pode incorporar atividades diferentes do seu
negócio inicial e, para executar novas tarefas, um número cada vez maior de competências são
desenvolvidas. Por sua vez, para melhorar os produtos e a rentabilidade das empresas do setor
automotivo, as montadoras têm feito algumas exigências para seus fornecedores e modificado assim os
critérios para a escolha e a forma de relacionamento com os mesmos.

As montadoras possuem diferentes critérios para a escolha de seus fornecedores entretanto,


existem exigências que são comuns a todas. O levantamento realizado pelo “Projeto CARS –
Plataforma Tecnológica da Cadeia Automotiva do Rio Grande do Sul” 2 aborda nove principais
exigências que os fornecedores precisam cumprir para fazerem parte da cadeia de uma montadora. São
elas: custos transparentes e capacidade de investimento; certificação ISO e QS; parcerias com
fornecedores e/ou instituições tecnológicas; integração eletrônica; desenvolvimento conjunto e rápido
de novos produtos, processos e sistemas; padrões internacionais de custo, qualidade, quantidade e
preço; logística; qualificação básica de mão-de-obra; e redução de desperdícios.

A partir deste hall de exigências, verificou-se a formação de tendências no relacionamento e


padrões de fornecimento entre montadoras e fornecedores, alocadas em três grandes itens:
desenvolvimento de fornecedores, proximidade entre a montadora e seus fornecedores e co-design.

O desenvolvimento do fornecedor pela montadora através da realização de contratos de prazo


mais longo permite o investimento em qualificação e capacitação. Neste caso, o mesmo deve estar
comprometido com o desenvolvimento tecnológico do produto, a qualificação da mão-de-obra e a
busca pela redução de custos.

Conforme Womack et al. (1997) o estabelecimento de contratos de longo prazo permite o


compartilhamento de informações sobre custos e técnicas de produção entre as empresas, melhora o
produto e reduz atividades que não agregam valor, o que possibilita a redução dos custos ao longo do
período de produção. Assim, a redução do número de fornecedores diretos da montadora possibilita o
desenvolvimento de relacionamentos mais próximos, bem como torna possível o fornecimento de
módulos completos.

A necessidade de reduzir os custos de logística e os custos de gestão dos carregamentos de


estoques aumenta a importância da proximidade entre as instalações da montadora e seus fornecedores
(Salerno et al. 1998). Relações mais próximas entre montadora e fornecedor ampliam a possibilidade
de realização de novos contratos no futuro. As empresas que estabeleceram contratos com a matriz da
montadora têm a chance de fornecer para outras filiais da mesma, aproveitando as vantagens da
proximidade, instalando novas unidades industriais em torno da montadora . Este processo está sendo
chamado de follow sourcing.

Entretanto, as montadoras ainda adquirem componentes de fornecedores externos, isto é,


adquirem produtos de empresas localizadas em regiões ou países distantes da sua unidade industrial. O
objetivo é, ao mesmo tempo, aproveitar a mão-de-obra, as matérias-primas e economias de escala e
criar um padrão de custos, de qualidade e de quantidade. É justamente este padrão que passa a ser
utilizado como referência para empresas que desejam participar de uma cadeia de fornecimento.

O co-design é a participação do fornecedor na etapa de concepção do produto, sua realização


estimula o desenvolvimento de novas tecnologias e novos processos produtivos. Conforme Womack et
al. (1997), para realização do co-design é necessário grande comprometimento e responsabilidade por

2
Ver Zawislak, 1999.

3
parte do fornecedor, diferente do que acontecia no modelo de produção em massa. A interação entre
profissionais de diferentes empresas e com conhecimentos diversos permite o aparecimento de idéias
novas, sendo que o investimento realizado em pesquisa é menor uma vez que duas ou mais empresas
estão envolvidas em um mesmo projeto. São estes fatores que contribuem para a redução dos custos e a
diminuição do tempo entre novas descobertas e sua aplicação.

São necessárias estratégias de crescimento, redirecionando o foco da gerência para melhorias


de desempenho, estabelecendo um fluxo contínuo, economizando capital e revitalizando a empresa. O
planejamento deve ser feito para que a produção seja contínua (fluxo), o que é essencial para que se
obtenha otimização de tempo e um certo grau de compromisso dentro e fora da empresa.

A produção enxuta, da forma como está sendo aplicada na indústria automotiva, apresenta em
linhas gerais, duas características principais, a saber:

• Uso de novas técnicas de gestão; e


• Integração com fornecedores

Em suma, as chamadas novas técnicas de gestão são consideradas sine qua non para ampliar a
agregação de valor na cadeia produtiva propriamente dita. Em outras palavras, trata-se de “sentar as
bases”, a partir do uso de um conjunto de ferramentas que tornem o processo mais racional em termos
de mais qualidade, menor custo, menos desperdícios. Enfim, amplia o impacto positivo da tecnologia
em uso na competitividade das empresas.

Claro que iniciativas individuais no sentido de racionalizar a fábrica não são mais suficientes
para que a cadeia como um todo passe a funcionar de modo mais racional/enxuto. É fundamental
estabelecer mecanismos para garantir a integração das empresas. Isto, por sua vez, amplia o próprio
processo de difusão das técnicas de gestão que irão facilitar a integração e assim por diante.

3. Casos de Três Montadoras de Veículos no Brasil

O sucesso dos modelos derivados da Toyota fez com que a maioria das empresas buscassem
formas de produção diferentes da produção em massa. Considerado como o “laboratório” mundial das
montadoras, o Brasil tem sido exemplo de aplicação de meios alternativos de produção e formação de
cadeia montadoras-fornecedores. Esta é a razão da escolha de três exemplos de empresas instaladas no
país.

“O Brasil virou um campo mundial de provas operacionais para a indústria


automobilística e uma base de projetos destinados a mercados emergentes. A
maior parte das marcas, tradicionais e novas, faz algum tipo de experiência em
suas fábricas e elege modelos globais para iniciar ou renovar sua linha” (Campo,
1999, capa).

Três exemplos recentes são emblemáticos. Com propostas diferentes entre si, Mercedes-Benz
do Brasil, Volkswagen e General Motors, vêm ampliando a mentalidade enxuta. A Mercedes-Benz do
Brasil (São Bernardo, São Paulo) bem mais centralizada, se contrapõe à Volkswagen (Resende) e seu
fantástico grau de horizontalização. Já a futura fábrica da GM (Gravataí, RS) pode ser considerada
como um caso intermediário.

Estes três casos serão apresentados a seguir, segundo a forma de uso de novas técnicas de
gestão e a integração com fornecedores.

4
3.1 Mercedes-Benz/São Bernardo do Campo 3

A fábrica da Mercedes-Benz em São Bernardo do Campo/SP vem sofrendo modificações na


filosofia de trabalho no tocante a montagem de caminhões e chassis para ônibus. A partir de 1994,
desenvolveu através da filosofia kaizen, várias técnicas hoje implementadas nas linhas de montagem:
kanban, just-in-time, one piece flow, células de manufatura, produção puxada.

Atualmente, a fábrica de São Bernardo do Campo, produz 15 mil veículos/ano com 10.500
funcionários, submetidos a pelo menos 128 horas por ano de treinamento. Esta unidade produtiva é
padrão de referência mundial de baixos custos operacionais e alto grau de produtividade para todo o
grupo de empresas Mercedes (Fábrica, 1999, p. C 1).

3.1.1 Técnicas de Gestão

Para executar o trabalho conforme a filosofia da produção puxada, a empresa utiliza a idéia de
one piece flow, isto é, uma única peça está disponível na linha de montagem não sendo possível ao
operador produzir mais do que o necessário em cada período. Entre uma máquina e outra as peças são
distribuídas pela ação da gravidade, obstruindo a passagem de mais peças. É como se em um
determinado instante toda a fábrica estivesse envolvida na produção de apenas uma peça. Assim, os
estoques de materiais comprados dos fornecedores e de produtos acabados estão sendo reduzidos. Para
isto, foi criado o modelo de “supermercado”. O supermercado é o local onde encontram-se peças para
meio turno de trabalho. A figura 1 ilustra o conceito de “supermercado” aplicado na empresa.

FIGURA 1: O Mapa da Produção na Mercedes


Fonte: Fábrica, 1999
3
Informações obtidas durante visita à empresa em julho de 1999 e em seminário realizado em Porto Alegre/RS com Luiz de
Carvalho, diretor adjunto da fábrica de eixos da Mercedes-Benz do Brasil, em março de 2000.

5
Outra ferramenta desenvolvida é o kanban. Entretanto, ao invés de utilizar cartões com cores,
o sinal para a reposição das peças é a luz vermelha que, quando acesa, indica o momento de produzir
mais um componente. Neste processo de melhoria e modificação da produção, a Mercedes conseguiu
reduzir em um terço a área de montagem e estocagem, destinando o local para outras atividades. Além
disso, existe por parte da empresa, a preocupação de diminuir ao máximo o desgaste das máquinas
evitando possíveis quebras que determinariam a parada da linha; atualmente 97% 4 das máquinas estão
disponíveis para o uso.

Destaca-se o fato da empresa não ter feito grandes modificações do maquinário nem
aumentado significativamente os processos automatizados. Entre os fatores que contribuíram para a
mudança sem a necessidade de elevar o grau de automação é o constante treinamento dos
funcionários, submetidos a grande número de horas por ano de aperfeiçoamento, e o crescente número
de kaizens.

Através da implementação das idéias da produção enxuta e a partir da adaptação dos conceitos
e técnicas à realidade da unidade de São Bernardo, a empresa conseguiu melhorar a produtividade em
20% e a qualidade dos produtos em 40%, reduzindo em 20% a área efetivamente ocupada (Fábrica,
1999). Foram 6 anos de trabalho, demonstrando desta maneira que a mudança de filosofia é um
processo necessário mas que deve ser feito de forma gradual, para que os resultados sejam sólidos,
duradores e benéficos.

3.1.2 Integração com Fornecedores

A empresa tem adaptado os princípios da produção enxuta trazidos da Toyota do Japão,


buscando reduzir estoques, melhorar a comunicação dentro da fábrica e com os fornecedores, além de
exigir um maior comprometimento desses com o processo como um todo. O relacionamento entre as
partes, embora os fornecedores localizem-se fora da área da montadora, é muito importante, a fim de
que as peças fornecidas tenham um grau de qualidade exigido pela Mercedes-Benz e sejam entregues
no momento certo para manter o fluxo da linha de produção (Lima, 1999).

O que a Mercedes tem feito em São Bernardo é adaptar os conceitos enxutos, onde o ponto
principal é produzir conforme a demanda do cliente (produção puxada). “Esses métodos pregam que o
ritmo operacional é determinado pela necessidade de cada cliente. A produção é condicionada pelos
pedidos e o objetivo é o estoque-zero de peças e do produto final” (Fábrica, 1999, p. C 1).

3.2 Volkswagen/Resende 5

A unidade da Volkswagen de Resende/RJ, através do revolucionário consórcio modular, traz


os fornecedores literalmente para dentro da fábrica. Ela produz ônibus e caminhões e está dividida em
módulos operados por sete empresas contratadas que trabalham diretamente ligadas à linha de
montagem e seus funcionários atuam na linha, ficando a parte de inspeção de qualidade e coordenação
da produção com a montadora (Volkswagen, 1999, p.C-6). De certa forma, este modelo “mistura”
técnicas de gestão e integração com fornecedor, uma vez que estes são os responsáveis por aqueles,
“restando” à Volkswagen o controle final de qualidade.

4
Ver nota de rodapé número 3.
5
Muitas das informações contidas nesta seção foram fornecidas por profissionais da Volkswagen em palestra ministrada ao
NITEC/PPGA/UFRGS em dezembro de 1999.

6
3.2.1 Técnicas de Gestão

O consórcio modular é mais uma tentativa de modelo de produção que coloca nas empresas
parceiras a responsabilidade de dividir riscos e lucros. O sistema de Resende se apresenta como
inovador, uma vez que os sistemistas estão dentro da planta da montadora (conforme figura 2) que
neste caso não executa a função de montar o veículo. Até o momento este modelo tem dados resultados
para a Volkswagen ao mesmo tempo que tem servido de exemplo para as demais montadoras.

peças
peça

testes finais
cabine teste de

Montagem final
tapeçaria estrada

auditoria
pintura
peça

peça motor
rodas e chassi
pneus
suspensão

FIGURA 2: Planta da Volkswagen em Resende


Fonte: elaborada pelos autores

Assim como outras montadoras, a Volkswagen tem procurado reduzir os níveis de estoques,
aumentar a qualidade e a produtividade por meio de novas técnicas gerenciais. A diferença é que, neste
caso, as principais exigências de qualidade feitas aos fornecedores (por exemplo, através do certificado
QS), são implementadas in loco sob a égide da Volkswagen.

3.2.2 Integração com Fornecedores

O consórcio modular estabelece transformações necessárias na busca de uma parceria na


cadeia produtiva para o efetivo envolvimento dos parceiros em todas as etapas e o atingimento de um
novo patamar competitivo. Busca-se a redução de custos e o aumento da produtividade ao longo de
toda a cadeia. A montadora concentra seus esforços no projeto, na qualidade, no marketing e nas
vendas, o valor agregado industrialmente pela montadora é mínimo.

Em relação ao pessoal que trabalha no consórcio, é interessante o fato de todos que possuem
cargos semelhantes ganharem salários idênticos mesmo sendo contratados por empresas diferentes. São
ao todo em torno de 1.400 funcionários: 300 da própria VW que atuam nas área de projeto, engenharia
e qualidade; em torno de 600 funcionários das empresas participantes do consórcio e aproximadamente
500 de pessoal terceirizado.

Nesta fábrica, a Volkswagen investiu apenas na montagem da planta, a parte de aquisição de


maquinário ficou por conta das empresas parceiras. Quanto à parte produtiva, a VW trata de fazer o
planejamento da produção, indica os fornecedores que os parceiros poderão trabalhar e negocia os
preços com esses fornecedores, além de cuidar da parte de supervisão de qualidade.

7
De certa forma, a idéia de que a cadeia deve funcionar como “uma única empresa” torna-se
realidade: as relações de fornecimento entre os elos da cadeia se dão in loco na produção/montagem.

3.3 General Motors/Gravataí6

A mais nova planta da General Motors (figura 3) começou a ser construída no ano de 1997 em
Gravataí, no Rio Grande do Sul, e faz parte de um projeto maior, junto com outras novas fábricas, onde
a GM está procurando desenvolver um novo modelo de produção.

Atualmente 700 pessoas estão trabalhando na fábrica da GM e outras 200 estão em treinamento
nos sistemistas. A previsão é de que mais 800 funcionários sejam contratados nos próximos 6 meses,
podendo chegar ao número de 4 mil empregados quando a fábrica estiver trabalhando com capacidade
total (Obras, 1999).

Esta unidade industrial apresenta, então, um novo sistema de produção. O automóvel será
produzido em módulos, em um sistema de parceria com 17 empresas sistemistas, localizados no site da
GM onde os mesmos são responsáveis pela entrega de módulos completos. Este modelo permite
explorar as competências dos fornecedores e buscar reduzir os desperdícios e custos, aumentando a
lucratividade.

ZAMPROGNA

PELZER TI ARVIN
FUNILARIA BUNDY
PRENSA

IPA VALEO POLYPROM


GOODYEAR
PINTURA

(EDS)
DELPHI
MONTAGEM

VDO LEAR

ARTEB INYLBRA
FANAUPE

BOSAL SANTA
SOGEFI GEROBRÁS MARINA

GM FINAL

Figura3: Planta da GM em Gravataí


Fonte: elaborada pelos autores

3.3.1 Técnicas de Gestão

A nova planta é uma tentativa de tornar o sistema produtivo lean – onde todas as atividades
agregam valor. Os equipamentos e os serviços que serão utilizados em Gravataí são iguais aos das

6
Muitas das informações foram obtidas em visitas ao canteiro de obras e palestras de executivos e funcionários da empresa
nos anos de 1998 e 1999.

8
“fábricas TOP” da General Motors, tais como as de Shangai e da Tailândia. Estas unidades são as mais
automatizadas da montadora e onde a preocupação com a parte ergonômica, conforto do trabalho, é
mais acentuada. Além disso, os processos utilizados nestas fábricas são similares, uma vez que todas as
descobertas tecnológicas do centro de pesquisa dos Estados Unidos estão sendo utilizadas nestas novas
unidades.

A melhoria contínua é a filosofia da fábrica de Gravataí. Este processo será trabalhado em um


local de discussão sobre melhoria contínua, denominado de kaizen shop. Neste local os funcionários de
todos os níveis darão sugestões de como atacar os problemas.

Para manter a qualidade das peças recebidas dos fornecedores, a montadora criou o
Departamento de Engenharia de Qualidade do Fornecedor. Esse departamento fiscalizará o piloto do
lote antes da empresa entregar (primeiros lotes) e fará fiscalização periódica dos mesmos durante a
produção. Na ocorrência de problemas, este departamento irá até o fornecedor para verificar qual a
razão dos mesmos, uma vez que a responsabilidade de garantia é dada por eles .

Quanto a produção, a fábrica de Gravataí funcionará de acordo com sistema andon, onde
qualquer funcionário pode interromper a produção quando verificar a existência de falha durante o
processo. Desta maneira, o erro poderá ser corrigido antes do término da produção do veículo. Mas no
caso de faltar alguma peça de menor relevância o carro continuará sendo montado e será recuperado
somente no final da linha.

Para evitar erros, o trabalho será padronizado e os funcionários farão rotação conhecendo todas
as partes do processo. Em relação ao controle de qualidade do produto, o projeto estabelece a
realização de check-list antes de passar de uma área para outra. Além dos 3 portões de qualidade –
motor, tapeçaria e final de linha.

Especialmente em relação ao lay out da fábrica, será possível reduzir tempo de trânsito do
produto de uma planta para outra (pouca coisa deverá ficar em trânsito e em estoque), a área de
submontagem e o tamanho da planta a partir do melhor aproveitamento do espaço.

O processo total de montagem de cada unidade deverá demorar de 1,5 a 2 dias. Sendo este fato
possível uma vez que os sistemistas entregarão os módulos no exato ponto da montagem. A pintura na
nova fábrica será totalmente automatizada, e as peças pintadas para reposição não serão produzidas em
Gravataí.

O novo modelo de produção deverá ser capaz de apresentar uma série de vantagens. A primeira
delas envolve a troca de aprendizado entre montadora e sistemistas. Neste modelo, a montadora deixa
de apenas “ensinar” os sistemistas para também “aprender” com eles. Assim, é possível desenvolverem
juntos sistemas de qualidade e projetos. Desta forma, serão reduzidas as despesas de engenharia, o
tempo e custos de desenvolvimento de produtos; permitindo a melhoria da eficiência e da divisão dos
custos dos serviços comuns (condomínio e matéria-prima de processo).

3.3.2 Integração com Fornecedores

Além dos 17 sistemistas, a General Motors deverá contar com aproximadamente 100
fornecedores de pequenas peças que servem para vários módulos, os chamados fornecedores externos.
Com esses fornecedores a GM tratará diretamente, para desta maneira negociar melhores preços e
prazos. Ainda, o estoque programando para os fornecedores externos é de 12 horas devido ao risco de
falta de peças durante a produção, enquanto que para os sistemistas a montadora está buscando
trabalhar com estoque zero.

9
Para o faturamento de peças fornecidas pelos sistemistas e dos próprios veículos, a GM conta
com um regime especial. O sistema, aprovado pela Secretaria da Fazenda, emitirá ao final de cada dia
simultaneamente a nota fiscal de todas as empresas participantes, junto com a fatura do veículo (Obras,
1999).

A GM pretende trabalhar com seus fornecedores a partir da integração entre os agentes da


cadeia através do fluxo de informações contínuo, trabalho sincronizado e relações de parcerias. Espera-
se que todos os elos desta cadeia realizem as atividades em conformidade com os padrões estabelecidos
pela montadora.

4. Conclusões

A produção enxuta, apesar de ter surgido na indústria automotiva, possui um conceito


abrangente, podendo ser aplicada em outros segmentos. Um exemplo é a adaptação para o ramo da
construção civil, a Lean Construction, onde cada etapa de execução da obra pode ser racionalizada no
tocante a mão-de-obra utilizada, método construtivo e planejamento do empreendimento. Outro
exemplo é a industria aeronáutica nos Estados Unidos, que tem aplicado os princípios para redução do
lead time .

Como um conjunto de ferramentas e práticas, a aplicação da produção enxuta na indústria


automotiva tem melhorado o desempenho das fábricas com o emprego de técnicas que hoje já fazem
parte do cotidiano, como kanban, just-in-time, entre outras e, consequentemente, reforçado o
surgimento de novos padrões de fornecimento.

A proximidade entre montadora e fornecedores trás benefícios, tais como reduzir os custos de
transporte e possíveis estragos durante o percurso, reduzir os riscos de atrasos na entrega, facilitar a
troca de informações, e possibilitar o uso compartilhado de instalações e de mão-de-obra.

Como resultado prático, as três fábricas apresentam níveis diferentes de integração com
fornecedor, a Mercedes-Benz é a mais verticalizada, seguida da General Motors, que mesmo com os
sistemistas entregando módulos completos ainda é responsável pela montagem do veículo. A
Volkswagen adota o modelo mais horizontal, onde as empresas parceiras produzem os componentes e
realizam a montagem, cabendo a Volkswagen o controle de qualidade do produto fornecido e
determinação do volume de produção.

A integração das empresas montadoras com os seus fornecedores, conforme descrito acima,
juntamente com a aplicação de técnicas de gestão, que vão ao encontro da produção enxuta, podem ser
simplificadas no quadro abaixo:
QUADRO 2: Resumo das principais características nas montadoras
Características Mercedes-Benz Volkswagen General Motors
Integração com Fornecedores entregam fornecedores executam fornecedores entregam
fornecedores peças e componentes, a montagem módulos completos
empresa fabrica vários
módulos
Técnicas de kanban, JIT, one-piece- redução de estoque kaizen shop, sistema
Gestão flow, sistema andon, kaizen andon

Observando estas diferentes experiências é possível concluir o que segue. Na medida em que o
processo de “enxugamento” da produção avança – isto é, que aumenta o grau de proximidade física e

10
virtual entre montadoras e fornecedores – o uso de novas técnicas de gestão passa de estratégico para
operacional. Consequentemente, o foco estratégico direciona-se para o relacionamento inter-firmas.
Mais do que aplicação de técnicas e ferramentas conhecidas, a idéia de integração enxuta de cadeia
envolve um importante esforço de inovação; inovação na forma de comunicação (e-business, e-
commerce), na forma de contratação, no conteúdo das responsabilidades individuais e, até mesmo, no
modo de faturamento.

A Mercedes-Benz, por exemplo, transformou completamente suas práticas gerenciais a partir


do modelo japonês. Os ganhos (de tempo, de espaço, de qualidade, de produtividade) são
consideráveis, porém estão, essencialmente, restritos à planta da empresa. Não existem fornecedores
localizados no site, o que mantém um certo grau de verticalização na empresa.

Já a Volkswagen coloca seus principais fornecedores como responsáveis diretos da montagem.


À Volkswagen "resta" programar a produção como se estivesse programando suas próprias compras.
O suprimento é a própria produção.

No caso da General Motors, o modelo de verticalização é, em parte, quebrado, com a


transferência de responsabilidades a fornecedores muito próximos. Como a montagem ainda é da
General Motors, faz-se necessário desenvolver um modelo estratégico composto por novas técnicas de
gestão e novas formas de fornecimento. A logística integrada tem aqui um papel-chave e, para muitos,
inédito. A gestão da produção é paralela à gestão da cadeia de suprimentos.

De qualquer forma, o objetivo maior destas empresas parece ser o mesmo: aumentar a
rentabilidade e a competitividade em um mercado cada vez mais dinâmico. Nos três casos, a forma
encontrada para alcançar esses objetivos foi a utilização de princípios enxutos, devidamente adaptados
às diretrizes organizacionais de cada uma delas.

5. Bibliografia

CAMPO de provas de inovações. Gazeta Mercantil. Porto Alegre, 03 de setembro, 1999. Relatório
Gazeta Mercantil Indústria Automobilística.

FÁBRICA do ABC é padrão mundial da Mercedes. Gazeta Mercantil. Porto Alegre, 27 de julho,
1999, página C-2.

LIMA, Luiz S. P. “A Montagem final Puxando a Produção (Mercedes-Benz)”. In: Womack, J. et al.
Lean Summit Brasil 99. São Bernardo do Campo, Lean Institute Brasil, 27 e 28 de julho 1999.
OBRAS da GM estão na reta final. Gazeta Mercantil. Porto Alegre, 21 de janeiro, 2000, Gazeta
Mercantil Rio Grande do Sul Veículos.

SALERNO, M. & ZILBOVICIUS, M. & ARBIX, G. & DIAS, A. Mudanças e Persistências no Padrão
de Relações entre Montadoras e Autopeças no Brasil. Revista de Administração, São Paulo, v. 33,
n. 3, p. 16-28, 1998.

VOLKSWAGEN alemã passa a controlar a fábrica de Resende. Gazeta Mercantil. Porto Alegre, 08 de
dezembro, 1999, página C-6.

WOMACK, J. P. & JONES, D. & ROSS, D. A Máquina que Mudou o Mundo. Rio de Janeiro:
Campus, 1997.

11
WOMACK, J. P. & JONES. A Mentalidade Enxuta nas Empresas. Rio de Janeiro: Campus, 1998.

ZAWISLAK, Paulo Antônio (coord.). Diagnóstico Automotivo. A Plataforma Tecnológica da Cadeia


Automotiva do RS. Porto Alegre: UFRGS/PPGA/NITEC/FIERGS, 1999.

12

Das könnte Ihnen auch gefallen