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Quando Afonso anuncia que Emanuel, o amante de olhos verdes, chegou para
buscar Alice, todos são surpreendidos pois ela sabe que esse Emanuel não existe e,
embora os amigos dela não tivessem certeza de que ela havia mentido,
desconfiavam de que se tratasse apenas de um delírio, como de fato era.
A chegada do tal amante subverte, pois, as leis da razão ao fazer irromper no real
um ser fictício, produto da imaginação prodigiosa de uma mulher carente.
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@ fenômeno de ³A caçada´ está no encontro da personagem com o seu
duplo, ou seja, com o seu outro eu soterrado pelo tempo.
Imagina ter sido o artesão que confeccionou a peça, o pintor que fez o
quadro original, o caçador que tem o arco empunhado para a caça arquejante
ou o companheiro que fica à espreita por detrás da árvore.
Assim, descobre o seu duplo e termina ferido. Não se pode assegurar que
ele morre, nem que espaço predomina no desfecho: se o chão do bosque ou o
da loja.
A protagonista, então, descobre o mistério: aquela moça fora ela em outra vida
Sabendo a atitude extrema que ela tomará, a personagem tenta impedi-la, mas não
consegue.
Esse fenômeno poderia perfeitamente ser explicado pelo Espiritismo, mas, como o
texto não faz nenhuma menção a crenças religiosas nem propicia pistas que
justifiquem o fato ocorrido, o efeito fantástico se consolida.
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Como não conseguem descobrir de onde vêm os insetos, nem o que capacita a
minúscula espécie a proceder tal operação, supõe-se a intervenção do
sobrenatural.
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@ discurso do conto ³Seminário dos ratos´, entretanto, não propicia dados que
confirmem tal simbologia, e para que haja alegoria (uma representação da realidade),
é necessário que o texto traga referências explícitas aos fatos vinculados à realidade
Referencial.
Assim, pode-se fazer a leitura fantástica do texto a partir da estranha invasão dos
ratos à mansão onde se realiza o ³VII Seminário dos roedores´.
Que explicação racional pode haver para o poder que adquirem os mamíferos
roedores, capacitados que se encontram de conduzir alimentos e objetos
desproporcionais para os seus tamanhos?
Enquanto aguarda o desfecho, ela fica temerosa que descubram que quem se
atirou do prédio foi uma jovem nua.
Após o forte vento que assolou o jardim, no lugar em que eles se encontravam,
aparecem o passarinho de penas azuis e a borboleta, exatamente as espécies
escolhidas para a transformação.
Comovida, ela tenta fugir para não presenciar o desespero da mãe, mas é
surpreendida pela declaração dela: ³ - Acordou o dorminhoco!´.
Após o transplante, o jovem percebe que não tem nenhum domínio sobre os
olhos, pois eles não querem atender o seu desejo de olhar a estrela branca - razão
mística da sua existência.
Sem encontrar meio de libertar-se, o jovem decide, outra vez, cometer o suicídio
para assassinar os monstruosos olhos, que, apavorados com a idéia da morte,
passam, então, a obedecer a ele.
Ao sair para o trabalho, ele se depara outra vez com o mesmo jardim, desta vez,
não mais em sonho.
E, para fugir da morte, arquiteta uma saída: se no sonho, ele escapou acordando;
em vigília, haverá de escapar dormindo.
Mesmo sabendo que a sua presença significa uma verdadeira agressão àqueles
que, assolados pela decrepitude, se isolaram ali para esquecer o mundo, ele
mantém uma postura imperiosa, a ostentar a beleza e a saúde da juventude, como
se tivesse a intenção de ferir propositadamente os velhos.
Por fim, a própria narrativa sugere o assassinato, ao relatar que, durante o jantar,
o rapaz ³achou um certo amargor na goiabada com queijo´ e, após, ³já não se sentia
bem´.
Supõe-se, pelas pistas dadas no relato, que os velhos decidiram realmente pela
exclusão do intruso, sem ponderar os meios.
Não esqueçamos que o narrador, tomando as palavras do porteiro, avisou ao
jovem que eles (os velhos ) usariam de todos os recursos para que as regras do
jogo fossem cumpridas: até onde poderia chegar o ódio por aquele que viera
humilhá-los, irônico, provocativo, tumultuando a partida.
Imbuído do intuito de vingança, por ter sido trocado por outro só por causa de
dinheiro, ele a induz a entrar numa catacumba, fingindo-se consternado por ter
enterrado os seus familiares queridos ali.
Apesar da incerteza dos fatos, concernente aos textos fantásticos, a narrativa não
se insere no gênero, pois nada há de inexplicável; há, sim, muito de inusitado e
macabro, pois não é comum um convite para fazer uma despedida num cemitério
abandonado, de onde se pode ver ³o pôr-do-sol mais lindo do mundo´ (p. 204).
Em ³@ dedo´, é o insólito o motivo condutor da história.
Catando conchas e seixos numa praia selvagem, uma moça encontra, entre as
coisas que o mar atirou na areia, um dedo.
A partir daí, ela começa a lançar hipóteses sobre quem seria a dona do dedo e
conclui que seria, provavelmente, uma mulher rica e de meia-idade.
Perseguida pela personalidade dupla, a personagem vê-se tentada pelo seu lado
calculista a ficar com o anel.
Mas, com medo de que a morta, a ³dama do mar´ como ela a denomina, o
reclame, decide por obedecer ao seu lado emotivo e enterra o dedo na areia da
praia.
*
³Que estranho. Lembrei-me de tantas! Mas justamente nela eu não tinha pensado...´
[...] Inclinou-se para beijá-la´
@ velho de ³@ muro´, enquanto criança, era tão obsediado para ver o que
existia no quintal do vizinho, misteriosamente escondido pelo muro que os pais
não o deixavam transpor que, nos instantes finais da sua vida, resgata os
momentos da infância só para poder conhecer o enigmático território.
outra se suicida por não acostumar-se àquela vida e não ter jamais encontrado
quem desejasse tirá-la do triste ofício.
w É utilizando-se de uma linguagem simples e escorreita que Lygia jagundes
Telles costura os seus enredos, arquitetados na consciência da técnica do texto,
que não funciona simplesmente como um instrumento de catarse, mas, antes,
de testemunho vivo da sociedade contemporânea.